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Daniela Mercury quer reeditar Semana de 22 em novo disco
"Canibália" tem também o movimento tropicalista entre suas referências
MARCUS PRETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Assim que o gravador que registraria as perguntas e respostas para esta reportagem foi ligado, outro, muito mais moderno, foi logo posto ao lado dele. A
dona era a própria entrevistada, a cantora Daniela Mercury.
Antes de dar o "play", avisou:
"Gravo minhas entrevistas todas. Adoro guardar e ficar com
o sentido do que eu quero".
Neste momento, o sentido do
que ela quer está guardado em
"Canibália", décimo álbum de
estúdio. A clara referência à
Tropicália de Caetano Veloso e
Gilberto Gil é assumida pela artista, mas, segundo afirma a autora, não está sozinha.
"Minha ideia é reiterar e ampliar também o conceito da Semana de Arte Moderna", diz.
"Afirmar que é preciso quebrar
barreiras. Que é permitido a todos fazer qualquer tipo de fusão
e não é necessário seguir tradições nem olhar para o outro
com idolatria. Estou acrescentando meu olhar a isso tudo."
A ideia soa ambiciosa. Na
mesma medida das que a cantora tem levado aos carnavais
de Salvador. Enquanto suas colegas de avenida mantêm a fórmula segura do trio de axé, Daniela arrisca misturas ousadas,
como um trio eletrônico, com
DJ, e outro de música clássica,
com pianista tocando Beethoven, de fraque, em meio à folia.
Se deu certo? "O presidente
de uma companhia [de discos]
me disse uma frase: "Dan, você
erra, mas erra para o futuro.
Então não tem problema'", diz.
"Meu universo de interesses é
muito maior do que simplesmente celebrar a alegria."
Em 2010, o samba-reggae faz
25 anos. Daniela Mercury, responsável por difundir o gênero
em larga escala pelo país, gosta
de compará-lo ao blues.
"Dentro do nosso contexto
de povo mais festivo, a "África"
daqui encontrou outras formas
de fazer seu lamento", diz. "O
único canal que o cara tem para
dizer "olhe pra mim, eu sou arretado" é a música. Só na música e na cozinha nego é rei."
Ivete Sangalo, Claudia Leitte.
Daniela já cansou de ouvir perguntas sobre o que pensa de
suas duas, digamos, "sucessoras" no reinado do axé. Sempre
escapa pela tangente.
"Eu não gerei ninguém. Só fiz
abrir a picada", diz. "Mas abriram para mim, também. Caetano, Gal. A gente vai ampliando
esse portão. Aconteceu só de eu
ser a catalisadora daquela música. São sincronicidades."
Contraditoriamente, é na
mesma cidade em que aconteceram a Semana de 22 e a Tropicália -movimentações artísticas a que o novo trabalho de
Daniela se refere- que a cantora diz ser pior interpretada.
"Até hoje sinto os jornalistas
de São Paulo um pouco desconfiados de mim", afirma. "As
pessoas daqui olham para a
gente [da Bahia] como se fôssemos estrangeiros.
Ainda há
muita incompreensão do que
são as distintas culturas. Vocês
não podem ter afeto por algumas coisas, não podem entender por que uma pessoa dança
daquele jeito em Salvador."
Na última segunda-feira Daniela recebeu, das mãos da vereadora Mara Gabrilli, o título
de cidadã paulistana.
CANIBÁLIA
Artista: Daniela Mercury
Gravadora: Sony Music
Quanto: R$ 20, em média
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