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Governo defende filmes populares
Plano é atrelar apoio a resultado
das produções, atraindo a classe C
Público do cinema nacional quase dobrou em 2009; migração de incentivo para títulos comerciais preocupa produtores independentes
ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL
Acalentado pelo sucesso de
quatro comédias que, juntas,
venderam mais de 12 milhões
de ingressos, o governo quer
apostar seus incentivos em filmes de "comunicação com o
público". Durante um encontro
com donos de salas de exibição,
em São Paulo, o presidente da
Agência Nacional de Cinema
(Ancine), Manoel Rangel, trouxe à tona a intenção de atrelar o
apoio financeiro ao resultado
das produções.
"Deve haver uma proporção
entre o que o Estado investe e o
retorno", diz Rangel. "Um filme
que faça 200 mil espectadores
deve ter um orçamento e um
lançamento compatíveis com
seu tamanho." Deve ser essa a
base, inclusive, da nova linha de
investimentos do Fundo Setorial do Audiovisual, a ser anunciada na semana que vem.
A declaração sucedeu o
anúncio de um plano de construção de 600 novas salas, nos
próximos quatro anos, em lugares carentes de telas. Assentado
em oferta de crédito e desoneração tributária, o projeto, orçado em R$ 550 milhões, pretende desfazer o nó da exibição.
Concentrado nas classes A e
B, o circuito atende a cerca de
10% da população. O Brasil, hoje, possui uma sala para 85 mil
habitantes. Na Argentina, a
proporção é de 38 mil e, nos Estados Unidos, de 8 mil.
"Esperamos um aumento de
50% na venda de ingressos,
mas isso tem que estar vinculado à existência de filmes populares", diz Rangel. "A mudança
de patamar do audiovisual brasileiro está na classe C. Um filme só faz mais de 1,5 milhão de
ingressos se atrai a classe C."
Ideologia do sucesso
A endossar a tese de Rangel
estão os resultados deste ano. O
salto na renda dos filmes brasileiros, de R$ 89 milhões em
2008 para R$ 129 milhões até
novembro deste ano, se deve,
basicamente, a produções de
vocação popular.
Os filmes mais vistos foram
"Se Eu Fosse Você 2", "A Mulher Invisível", "Os Normais 2",
"Divã", "O Menino da Porteira"
e "Besouro". A exemplo de outros campeões da década, como
"Carandiru" ou "Dois Filhos de
Francisco", todos venderam
um bom número de ingressos
em salas localizadas fora do dito circuito de elite.
"Num mercado capenga como o brasileiro, essa medida do
sucesso é um perigo", rebate o
diretor Walter Lima Jr., de "Os
Desafinados". O cineasta pondera que muitos filmes brasileiros não chegam ao público pela
simples razão de quem não têm
espaço no circuito ou a publicidade da Globo por trás. "O risco
é que se crie uma ideologia global, nascida na TV, que passe a
dominar o cinema. E, enquanto
isso, a classe C continua baixando filmes na internet ou
comprando na esquina."
Para o cineasta Ugo Giorgetti, de "Boleiros", não se pode
perder de vista que as classes C
e D veriam filmes brasileiros se
eles passassem na TV. "Além
disso, eu me pergunto: "O que é
um filme para a classe C?". A
produtora Sara Silveira, de "É
Proibido Fumar" e de outros títulos premiados em festivais,
responde: "A classe C veria
qualquer filme desde que os ingressos fossem mais baratos".
Ajuda para o mercado
Sustentada, sobretudo, por
incentivos fiscais, a produção
nacional atravessou os anos
2000 tendo como esteio os
concursos de empresas como
Petrobras e BNDES. Mais recentemente, foram criados novos formatos, de fundos de investimento, que tentam estimular a busca por melhor desempenho na bilheteria.
"A política audiovisual tem
um viés assistencialista, mas
deveria ser tratada como política de desenvolvimento industrial", diz Sérgio Sá Leitão, presidente da RioFilme.
Mas filmes embalados para o
mercado precisam de verba pública? "Eles precisam de apoio
para que, em alguns anos, caminhem sozinhos", diz a produtora Vânia Cattani. "A esquizofrenia entre indústria e arte
sempre existiu. Se estamos vivendo isso é porque o mercado
está crescendo."
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