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CINEMAS/ESTREIAS
Crítica/ "Aconteceu em Woodstock"
Woodstock de Ang Lee é paz, amor e negócios
Longa contrasta valores puritanos
de cidadezinha com o festival
de 1969
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Para evitar decepções, é
preciso dizer logo de cara que o espectador de
"Aconteceu em Woodstock"
não verá nem sequer um show
de Woodstock. Nisso, aliás, está
empatado com o protagonista
do filme, o jovem Elliott Tiber
(Demetri Martin), em cujas
memórias o filme se baseia.
Filho dos donos de uma pousada prestes a falir em Catskills,
Elliott Tiber intui a oportunidade de salvar a propriedade familiar quando outra cidade recusa-se a receber o que seria o
marco da contracultura, no final dos anos 1960.
Este é, de resto, o grande momento do filme: quando tomamos contato com a cidadezinha
(reacionária, como se presume)
ou quando os primeiros responsáveis pelo festival aparecem no hotelzinho (estranha
cena: primeiro, os hippies, à
frente; logo atrás, cheios de
pastas e ternos, os homens de
negócio).
Não se imagina ainda a dimensão que o festival vá tomar.
E é a graça das coisas que acontecem sem que se possa esperar
que leva o início do filme: a caracterização da cidadezinha, a
mãe mesquinha a ponto de superar o clichê esboçado, o pai
triste, o hotel sórdido, os antissemitas...
É claro que não falta a televisão informando acontecimentos que, aparentemente, pouco
interessam ao local: a guerra no
Vietnã e a conquista da Lua, sobretudo: a guerra, em especial,
deve ser o contraponto a
Woodstock. A proposição "paz
e amor" surgia como manifesto
pacifista; a música (e as drogas
e os hábitos liberadores) significavam uma adesão dos jovens
a modos de vida distantes da
tradição puritana, em crise.
O que há de mais significativo no filme cessa por aí. Como
se não quisesse realmente se
aprofundar no que foi aquele
momento. Como se isso fosse
um certo incômodo, Ang Lee
prefere ciscar um pouco em toda parte: o movimento, o improviso, a multidão, a farra.
Termina por patinar, o que não
surpreende. Seu ponto, como
em todo filme, é a sexualidade,
ou antes, a homossexualidade.
O que Woodstock provoca em
Elliott, cujo lado gay parece pedir uma chance desde o fotograma inicial.
Como se evitasse, ao remexer
nas cinzas de Woodstock, ser
acusado de agitar as águas também turvas das guerras atuais
em que os EUA se acham afundados, o filme deixa bem claro
como o célebre festival foi, afinal, tremendamente americano: é pelo destaque que dá, na
discrição e no silêncio que adotam, aos homens de terno por
trás de roqueiros e hippies.
Woodstock é visto assim, sobretudo, como um negócio.
Não muito diferente de Hollywood, afinal. Na guerra ou na
paz, em tempos de revolução
ou reação, este filme, nunca desagradável e poucas vezes tolo
(apenas em momentos que dizem respeito à mãe), afirma
uma essência imutável da América: o show não pode parar.
"ACONTECEU EM
WOODSTOCK"
Direção: Ang Lee
Produção: EUA, 2009
Com: Demetri Martin, Emile Hirsch
Onde: Espaço Unibanco Augusta,
HSBC Belas Artes e circuito
Classificação: 16 anos
Avaliação: bom
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