RICARDO CALIL
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Na primeira sequência de "Embarque Imediato", Wagner (Jonathan Haagensen) e sua namorada, funcionários respectivamente de um restaurante e de uma loja do aeroporto internacional do Rio, tentam embarcar clandestinamente num voo para os EUA, mas são barrados no avião por Justina (Marília Pêra), supervisora do aeroporto.
É um início promissor: ágil, bem filmado, com a trilha certa -pontuado pelos créditos do filme em animação. Com essa sequência, o diretor Allan Fiterman, paulistano radicado em Los Angeles, dá um recado claro em seu segundo longa: esta não é uma comédia televisiva, que se contenta com uma sucessão de planos fechados e contraplanos idem.
O filme filia-se a outra tradição, a das "screwball comedies", comédias malucas em que situações farsescas se sucedem em ritmo acelerado. Ora o longa remete à matriz americana do gênero, de filmes como "Levada da Breca" (1938), ora a seus descendentes espanhóis ("Mulheres à Beira de um Ataque de Nervos", de Almodóvar) ou cariocas ("Vai Trabalhar Vagabundo", de Carvana).
A trama gira em torno da relação afetiva que se desenvolve, depois daquele primeiro desencontro, entre Wagner, que sonha com uma vida melhor, e Justina, que busca nova motivação na vida, após desistir da carreira de cantora.
Infelizmente, o fôlego daquela cena inicial se perde ao longo da projeção, e o filme começa a girar em falso com diálogos que namoram clichês de autoajuda ("a vida não leva a lugar nenhum, a gente escolhe para onde a vida vai"), personagens que nunca deixam de ser caricaturas (mesmo o da sempre talentosa Marília Pêra) e momentos de humor que beiram a grosseria (em particular os de José Wilker, no papel de antigo amante de Justina e agenciador de modelos gordas). Nessas cenas, "Embarque Imediato" vira uma comédia televisiva -não por questões estéticas, mas pelo tom chuleiro das piadas.