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ESTRÉIAS
CINEMA/"BELÍSSIMA"
Anna Magnani monopoliza filme de 51 de Luchino Visconti
ESPECIAL PARA A FOLHA
Como esquecer as atuações
de Clara Calamai em "Ossessione" (1942), de Alida Valli em
"Sedução da Carne" (1954) e, especialmente, de Maria Schell em
"Um Rosto na Noite" (1957)?
Temperamental, explosivo, tirânico, Luchino Visconti era capaz
de fazer até mesmo de Claudia
Cardinale uma grande atriz.
Visconti domava qualquer fera,
mas Anna Magnani era, se me
perdoam a expressão, a "megera
indomável". Criatura passional,
insana, possessiva, Magnani fascinava e esgotava qualquer diretor.
Se "Belíssima" é o único filme de
Visconti em que, como confessou
o próprio, ele improvisou, é porque aqui o diretor não fez mais do
que se render, como tantos outros, ao talento voraz de Magnani.
O fato é que nenhum cineasta
conseguiu fazer um filme com ela
que não fosse um filme sobre ela.
Magnani é muitas mulheres ao
mesmo tempo, mas, justamente
por ser assim múltipla, é que ela
interpreta sempre a si mesma. A
atriz já é ela própria uma (shakespeariana) personagem -por isso, como faria aliás Tennessee
Williams em "Rose Tatoo", é preciso escrever o texto especialmente para ela.
Não se trata, com ela, de um filme de Visconti, de Rossellini ("O
Amor"), de Pasolini ("Mama Roma"), mas de um filme de Magnani. Diante dela todos são edipianos, pois ela não representa, para
todos, senão uma grande, uma
inesgotável mãe romana.
Rossellini, seu ex-namorado, ao
testemunhar, por exemplo, a
grande comoção causada em Roma pela morte de Magnani, passava quase que inconscientemente, em sua autobiografia, a falar da
relação umbilical e despótica que
ligava mães e filhos na Itália. "É a
mamma", dizia ele. "É a mãe mediterrânea que explica, provavelmente, o agarramento feroz dos
italianos à vida, ao real. Os italianos estão agarrados ao útero."
Foi do pranto maternal de Magnani em "Roma, Cidade Aberta"
(Rossellini, 1945) que nasceu o
neo-realismo italiano. Três anos
antes, durante a guerra, Visconti
realizara o filme precursor do
movimento, "Ossessione". Magnani era a atriz escolhida para o
papel central, mas o nascimento
do filho, Luca, impediu a atriz de
protagonizar o filme. Vítima de
poliomielite, Luca viveria eternamente agarrado à barra da saia de
Magnani.
Homossexual, Visconti tinha
em Magnani uma de suas duas divas (a outra era Callas). A atriz,
confessava ele, lembrava-lhe da
mãe possessiva e protetora de sua
infância. Inspirando-se em mais
um daqueles tantos argumentos
criados por Cesare Zavattini, o
grande manancial do neo-realismo, Visconti resolveu realizar
com Magnani essa história de
uma mãe romana suburbana que,
aficionada por cinema, decide
transformar a filha pequena numa estrela (um fato, aliás, recorrente na história do cinema).
Magnani deitou e rolou. Em
"Belíssima", como sempre, ela
exerce um monopólio absoluto:
acrescenta "cacos" ao texto, revira
os cenários, chora e grita feito louca -como fazia nos bastidores,
aliás, apaixonada que estava pelo
eletricista da equipe.
O filme é estridente, histérico,
romano até o limite do insuportável. Luchino Visconti aproveita
aqui para fazer uma crítica velada
à indústria do cinema, criando,
numa auto-ironia, o personagem
de um playboy aproveitador da
Cinecittá e colocando, sobre a
participação do colega cineasta
Alessandro Blasseti (que faz aqui
o papel dele mesmo), o tema da
ária do charlatão de uma ópera de
Donizetti.
(TIAGO MATA MACHADO)
Belíssima
Bellissima
Direção: Luchino Visconti
Produção: Itália, 1951
Com: Anna Magnani, Walter Chiari, Tina
Apicella
Quando: a partir de hoje no Vitrine (r.
Augusta, 2.530, Cerqueira César, tel.
3085-7684)
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