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DANÇA/CRÍTICA
Julio Bocca encena alegrias e nostalgias no Municipal
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
São duas coisas bem diferentes: uma é falar de Julio Bocca
e outra do Ballet Argentino. Em
turnê pelo país, Bocca e sua companhia passaram por São Paulo
no último fim de semana, com
um repertório variado e um espetáculo dividido: de um lado, uma
grande estrela; de outro, uma
companhia lutando com dificuldades técnicas.
O programa de sábado começou com um clássico do coreógrafo norte-americano Alvin Ailey
(1931-89), "The River" ("O Rio"),
criado em 1970 para o American
Ballet Theatre, sobre música homônima de Duke Ellington (1899-1974). Ailey utiliza a metáfora do
fluxo do rio para falar de relacionamentos; ou como disse Ellington, "do nascimento... da primavera da vida... da reafirmação... da
reencarnação". Tudo isso numa
linguagem que justapõe gestos da
dança clássica sobre pontas, com
o suíngue do jazz, a torção e contração dos troncos e a amplitude
dos braços.
Mas aqui justamente se viam os
problemas de acabamento dos
passos e da precisão dos gestos do
grupo: alguns giros que começavam na ponta e antes do final já tinham caído, ocasional desarmonia de um conjunto que nem
sempre dançava em uníssono, dificuldades nos encadeamento dos
duos e deslizes individuais.
Em contraste, quando Bocca
entra na cena, o palco ganha outra
qualidade: a segurança com que
executa os passos lhe dá total liberdade para dançar, tornando o
espaço visível com as pontuações,
acentos, dinâmicas e a quebra de
registros que a peça exige, pressionando e empurrando cada
passo para além de si.
A noite prosseguiu com "Setembro", de Andrea Candela, um
duo dançado por Cecilia Figaredo
e Hernan Piquin. Logo no começo, enquanto fazia uma seqüência
de giros, Figaredo deslizou entre
os braços de Piquin; mas em seguida a dupla se afinou, e a peça,
sem grande invenção coreográfica, encantou e seduziu a platéia.
Piquin tem o virtuosismo de Bocca -seus giros terminam em suspensão, seus saltos se mantêm no
ar-, ao que se somam os arroubos de juventude.
"Piazzolla Tango Vivo", uma
suíte de solos, duos, trios etc., de
Ana María Stekelman, incorpora
passos e figuras inspiradas no tango, além de gestos da linguagem
clássica e moderna. Vale destacar
a virilidade do trio de homens sobre um banco, assim como o solo
"portenho" de Bocca com uma
mesa. No contraste entre o tempo
suspenso e as figuras passageiras
-por exemplo, nos "déboulées"
(giros em seqüência, com deslocamento)-, tem-se a impressão
de que ele desaparecerá. Ao final
da peça, um duo entre Bocca e outro bailarino tem passos bem característicos do tango com seus
volteios, cruzadas das pernas,
acentos das cabeças e reversões.
Para fechar a noite, outro clássico da dança: "Nine Sinatra Songs"
(1982), da coreógrafa norte-americana Twyla Tharp. Casais se sucedem em danças virtuosísticas,
comprometidas, no caso, por deslizes de encaixe e encadeamento.
É um grande baile da vida amorosa: do romantismo mais aberto ao
realismo dos desencontros e conflitos. Alegorizada pela roupa de
baile (vestidos vaporosos e ternos
escuros), essa vida dos bailes deixa no ar a nostalgia e ao mesmo
tempo a alegria das paixões, encenadas em registro teatral -que
nem por isso deixa de ser verdade.
Julio Bocca
Quando: hoje, às 21h
Onde: Palácio das Artes (Av. Afonso
Pena, 1537, Belo Horizonte, MG, tel. 0/
xx/31/ 3237-7399)
Quanto: R$ 40, R$ 50 e R$ 60
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