São Paulo, terça-feira, 12 de abril de 2005

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DANÇA/CRÍTICA

Julio Bocca encena alegrias e nostalgias no Municipal

INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA

São duas coisas bem diferentes: uma é falar de Julio Bocca e outra do Ballet Argentino. Em turnê pelo país, Bocca e sua companhia passaram por São Paulo no último fim de semana, com um repertório variado e um espetáculo dividido: de um lado, uma grande estrela; de outro, uma companhia lutando com dificuldades técnicas.
O programa de sábado começou com um clássico do coreógrafo norte-americano Alvin Ailey (1931-89), "The River" ("O Rio"), criado em 1970 para o American Ballet Theatre, sobre música homônima de Duke Ellington (1899-1974). Ailey utiliza a metáfora do fluxo do rio para falar de relacionamentos; ou como disse Ellington, "do nascimento... da primavera da vida... da reafirmação... da reencarnação". Tudo isso numa linguagem que justapõe gestos da dança clássica sobre pontas, com o suíngue do jazz, a torção e contração dos troncos e a amplitude dos braços.
Mas aqui justamente se viam os problemas de acabamento dos passos e da precisão dos gestos do grupo: alguns giros que começavam na ponta e antes do final já tinham caído, ocasional desarmonia de um conjunto que nem sempre dançava em uníssono, dificuldades nos encadeamento dos duos e deslizes individuais.
Em contraste, quando Bocca entra na cena, o palco ganha outra qualidade: a segurança com que executa os passos lhe dá total liberdade para dançar, tornando o espaço visível com as pontuações, acentos, dinâmicas e a quebra de registros que a peça exige, pressionando e empurrando cada passo para além de si.
A noite prosseguiu com "Setembro", de Andrea Candela, um duo dançado por Cecilia Figaredo e Hernan Piquin. Logo no começo, enquanto fazia uma seqüência de giros, Figaredo deslizou entre os braços de Piquin; mas em seguida a dupla se afinou, e a peça, sem grande invenção coreográfica, encantou e seduziu a platéia. Piquin tem o virtuosismo de Bocca -seus giros terminam em suspensão, seus saltos se mantêm no ar-, ao que se somam os arroubos de juventude.
"Piazzolla Tango Vivo", uma suíte de solos, duos, trios etc., de Ana María Stekelman, incorpora passos e figuras inspiradas no tango, além de gestos da linguagem clássica e moderna. Vale destacar a virilidade do trio de homens sobre um banco, assim como o solo "portenho" de Bocca com uma mesa. No contraste entre o tempo suspenso e as figuras passageiras -por exemplo, nos "déboulées" (giros em seqüência, com deslocamento)-, tem-se a impressão de que ele desaparecerá. Ao final da peça, um duo entre Bocca e outro bailarino tem passos bem característicos do tango com seus volteios, cruzadas das pernas, acentos das cabeças e reversões.
Para fechar a noite, outro clássico da dança: "Nine Sinatra Songs" (1982), da coreógrafa norte-americana Twyla Tharp. Casais se sucedem em danças virtuosísticas, comprometidas, no caso, por deslizes de encaixe e encadeamento. É um grande baile da vida amorosa: do romantismo mais aberto ao realismo dos desencontros e conflitos. Alegorizada pela roupa de baile (vestidos vaporosos e ternos escuros), essa vida dos bailes deixa no ar a nostalgia e ao mesmo tempo a alegria das paixões, encenadas em registro teatral -que nem por isso deixa de ser verdade.


Julio Bocca
  
Quando: hoje, às 21h
Onde: Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1537, Belo Horizonte, MG, tel. 0/ xx/31/ 3237-7399)
Quanto: R$ 40, R$ 50 e R$ 60


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