São Paulo, terça-feira, 12 de abril de 2011

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OPINIÃO

Cinema nacional seguiu a receita do sucesso

Filmes brasileiros de grande bilheteria deixaram de ser exceção, mas permanece o embate entre mercado e arte

TALVEZ AQUI, COMO NO MUNDO, ESTEJAMOS A PONTO DE FAZER A DISTINÇÃO ENTRE O CINEMA "DA ELITE" E O "DO PÚBLICO"

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Se passou a última década do século passado se recompondo do golpe desferido pelo governo Collor, o cinema brasileiro entrou no século 21 disposto a seguir a receita de Daniel Filho: comunicar é o negócio.
E não se pode dizer que ela não funcionou. Nos últimos anos, os "brazilian blocksbusters", com muita frequência apoiados pela Globo Filmes, deixaram de ser a exceção que "Cidade de Deus" (2002), "Dois Filhos de Francisco" (2005) ou "Carandiru" (2003) pareciam configurar há apenas alguns anos.
Passaram a emplacar em sequência, como se a receita tivesse enfim sido compreendida. O próprio Daniel Filho fez alguns filmes de sucesso, apenas obscurecidos pelo êxito de "Tropa de Elite", a surpresa, e "Tropa de Elite 2", o fenômeno, o filme que quebrou o recorde de "Dona Flor e Seus Dois Maridos" (1976).
"Tropa", em particular, trazia ainda uma novidade: uma dramaturgia rompida, surpreendentemente, com o padrão da Rede Globo desde os tempos de Oduvaldo Vianna Filho (1936 -1974) e Dias Gomes (1922-1999), ou seja, uma espécie de humanismo derivado do velho CPC.
"Tropa" introduzia outra linguagem -talvez melhor, talvez pior, mas em todo caso outra: o desejo de lei e ordem, a necessidade de não compreender em nada os problemas sociais ou psicológicos do banditismo, a urgência em combatê-lo, o desprezo pela corrupção.
É difícil discordar quando Gustavo Dahl afirma que "Tropa de Elite" tirou nosso cinema da insignificância.
Por uma vez, políticos sentiram a necessidade de ir atrás de um filme brasileiro, buscar respostas, entender a mensagem: existe no Brasil uma luta pelo poder entre o Estado, por um lado, e o tráfico de drogas, de outro.
Atrás, ou ao lado, de "Tropa" vêm "VIPs" (2011), "Bruna Surfistinha" (2011), "A Mulher Invisível" (2009), "Meu Nome Não É Johnny" (2008) etc.
Basicamente, tudo que os críticos entendem não acrescentar grande coisa ao cinema. Cinema de massa? Pode ser. Mas é o que o público vai ver. Quer queira, quer não.
Enquanto isso, a presidente da República assiste "É Proibido Fumar"(2009), que com a atriz Glória Pires e tudo não chegou nem aos cem mil espectadores.
A situação é estranha: tomamos enfim uma parte considerável do mercado interno, como sempre se desejou; chegou-se ao público de classe média, como sempre se preconizou.
Mas há no ar a sensação de processo partido, ainda incompleto, de incompreensões mútuas e profundas entre duas formas de compreender essa arte.
Talvez aqui, como no resto do mundo, estejamos a ponto de, muito breve, fazer a distinção entre o cinema "da elite" e o "do público". Seria lamentável. O que é certo: continuamos tateando.


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