São Paulo, sábado, 12 de maio de 2007

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Crítica/teatro

Versão de "Grande Sertão", "O Homem Provisório" não convence inteiramente

SÉRGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

A adaptação de "Grande Sertão Veredas", de Guimarães Rosa, é uma espécie de Santo Graal do teatro brasileiro. Por muito tempo, foi um projeto acalentado pelo Centro de Pesquisa Teatral de Antunes Filho, que acabou preferindo adaptar o conto "A Hora e a Vez de Augusto Matraga" do mesmo autor. Até hoje, 50 anos após seu lançamento, a saga de Riobaldo e Diadorim, romance de formação que faz a ponte entre tradições sertanejas e um experimentalismo de linguagem joyciano, nunca logrou caber no palco: só a trama soaria rasa, só o experimentalismo ficaria hermético.
Neste segundo exercício da Casa Laboratório, Cacá Carvalho de certa forma sai pela tangente ao devolver à trama sua origem popular. Durante um processo aprofundado, segundo os princípios do teatro antropológico da escola de Pontedera, que incluiu uma excursão ao Carari, Carvalho contou a história a seu Geraldo Alencar, discípulo de Patativa do Assaré, que a pôs em cordel. São esses versos que são apresentados em cena, e não a prosa de Rosa.
Nesse filtro, muito se perde: só quem leu o romance vai perceber a importância de Hermógenes, o traidor, contra quem o jagunço Riobaldo lidera a guerra, e por isso o pacto com o demônio, centro simbólico da narrativa, surge apenas como uma bela mas hermética coreografia. A ênfase é dada para o romance com Diadorim, este sim presente por inteiro.
Difícil destacar um ator nesse espetáculo coletivo, no qual a energia é grande, o gestual é preciso e a ruptura com o realismo é ousada e bem sedimentada no rigoroso treinamento físico da escola. Aqui e ali, também, se reconhece a marca que Antunes Filho ainda exerce em Carvalho, como nos deslocamentos em grupo e em uma guerra de sapatos que remete a uma antológica cena do "Romeu e Julieta" do CPT.
Figurino e adereços -cada ator carrega a réplica de sua própria cabeça decepada, alusão ao trágico fim do bando de Lampião-, a trilha envolvente e um eficiente e delicado cenário todo feito de cortinas transparentes levam o espetáculo a um universo grotesco e onírico.
Como na primeira experiência do grupo, que tinha como mote o Quixote de Cervantes, a base literária é apenas ponto de partida para imagens arquetípicas, que impõem respeito sem convencer inteiramente.
Não foi ainda dessa vez que o "Grande Sertão Veredas" encontrou o palco. No mais, a Casa Laboratório está bem armada para uma jornada que se propõe a longo prazo, e da qual este "Homem Provisório" é apenas o segundo passo.


O HOMEM PROVISÓRIO
Quando:
de sex. a dom., às 19h30; até 10/6
Onde: Sesc Avenida Paulista (av. Paulista, 119, tel. 0/xx/11/3179-3700)
Quanto: R$ 15
Avaliação: regular


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