São Paulo, segunda-feira, 12 de junho de 2000


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RELÂMPAGOS

Corpo na mesa

JOÃO GILBERTO NOLL

"Que sedosa aquela pele." Não, ele não tinha razões para aquele encantamento todo. Talvez por isso mesmo se encantasse. O certo, o palpável é que estava naquela terça-feira à tarde. E que havia o ruído de uma serra mecânica pelos arredores. Só podia contar com isso, nada mais. Agora, talvez, fosse para a cozinha e abrisse a geladeira. Que estava, sim, vazia. De novo muito pouco, quase nada. Era obrigado a concordar. E ele, um flautista que tirava seu ralo sustento da flutuação musical, pôs-se a tremer severamente. Olhem: o corpo inteiro de bruços sobre a mesa. Tudo porque não queria destilar enjoativos licores de sua fragilíssima situação. Num repente, estancou os tremores. Virou-se. Fingiu-se de morto. E sentiu um arranque brutal para fora de sua escassez.



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