|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Sétimo mercado de CDs, Brasil não tem revistas pop
CLAUDIA ASSEF
DA REPORTAGEM LOCAL
Com o fim da "Showbizz" e a
chegada incerta da "Rolling Stone" ao país, o brasileiro que procura uma boa revista sobre música e cultura pop nas bancas é obrigado a recorrer a publicações importadas. O fato não seria tão chocante não fosse o país historicamente um dos maiores mercados
consumidores de CDs do mundo.
Em 2000, por exemplo, o Brasil
comercializou o equivalente a
US$ 725 milhões em discos, montante que colocou o país como o
sétimo maior mercado fonográfico do ano.
Foram vendidos quase 105 milhões de CDs, descontando-se aí o
volume assustador comercializado no mercado pirata. Como explicar, então, o fato de o Brasil
gostar tanto de música, mas não
conseguir sustentar publicações
sobre o tema?
A pergunta fica mais complicada quando se olha para o vizinho.
A Argentina, mercado infinitamente menor do que o brasileiro,
tem duas das revistas mais bacanas de música do planeta: uma
versão da norte-americana "Rolling Stone" e a "Les Inrockputibles", revista francesa que há cinco anos circula no país em versão
nacionalizada.
A pedido da Folha, profissionais que lidam diariamente com o
mercado fonográfico tentaram
desvendar o mistério.
Folha - Por que o Brasil não tem
hoje uma revista sobre música e
cultura pop?
Pedro Só, 33, editor do site Usina
do Som - Temos um índice baixíssimo de leitura, seja de livros ou
revistas, per capita e é preciso
lembrar que jamais houve uma
revista brasileira decente cujo
projeto editorial abraçasse todos
os segmentos do mercado. Existem as revistas "trade", voltadas
para lojistas, para o "meio". Mas
as que estão aí hoje não são jornalisticamente sérias, estão mais para o que se chama de "jabazine".
É fácil culpar as gravadoras, que
não hesitam em apoiar os "jabazines" e que, em vários momentos,
deixaram de anunciar em projetos como a "Bizz/Showbizz", que
não lhes permitia determinar
quem estaria na capa nem o teor
das críticas. Mas uma coisa precisa ficar clara: neste país, revista de
pop/rock é coisa segmentadíssima, que despreza as mais gordas
fatias do mercado em nome de
um sectarismo que não faz mais
sentido para a maioria dos jovens.
Emerson Gasperin, 30, último
editor da "Showbizz" - Levando-se
em consideração que a "Bizz" era
uma revista de porte médio, não
faz tanto tempo assim que o Brasil
está sem um veículo decente de
música. Mas, nos últimos 16 anos,
existiu esse veículo -sem falar
nas revistas que abordam gêneros
específicos de música (metal, rap
etc.)- que, bem ou mal, estão aí
até hoje. Não sei se o fato de o país
ser um grande mercado fonográfico tem relação imediata com a
manutenção de uma revista de
música. As poucas ocasiões em
que as pautas coincidem com a
lista dos mais vendidos são com
artistas como Renato Russo, Axl
Rose, Nirvana... ou febres, como
Mamonas ou Los Hermanos.
Aí acontece o seguinte: se você
botá-los na capa, seu produto
vende que é uma beleza, por atrair
leitores que não são frequentes
compradores de sua revista. No
mês seguinte, com alguma capa
mais "normal", os números desmoronam novamente. Se pegarmos a lista dos artistas que mais
vendem discos, veremos que a
maioria deles não aparece em revistas de música e, sim, em revistas de famosos e/ou fofoca. Por
que, então, as revistas de música
não abordam esses artistas? Simples: porque o que interessa aos
fãs desses artistas é saber quem o
cara anda namorando, qual o seu
carro, onde ele vai à noite.
André Barcinski, 33, jornalista - É
um paradoxo difícil de explicar.
Não acho que seja por desinteresse dos leitores. Um dos maiores
problemas, acho, é a concorrência
dos jornais. Na Europa e nos
EUA, os jornais diários não cobrem a cena musical com muito
afinco, deixando essa função com
as revistas especializadas. No Brasil, eles fazem uma cobertura musical muito mais abrangente.
Acho que uma revista de música,
para fazer sucesso no país, teria de
fazer uma cobertura diferente da
dos jornais, talvez investindo em
grandes reportagens.
Carlos Eduardo Miranda, 39, diretor artístico da gravadora Trama
-°Às vezes acho que boa parte do
público interessado em música
não é tão interessado em ler sobre
música. E também tem o seguinte:
para fazer uma revista de bom
conteúdo e boa apresentação é
preciso bastante dinheiro. Para
compensar, seria necessário vender bem. Para isso, seria necessário atingir um público diversificado. Expandindo o leque de público acaba-se limitando a liberdade
de opinião da revista, forçando-a
a ser "simpática".
André Forastieri, 36, dono da editora Conrad - Nos países pobres
em geral é assim. No G-7 existem
mais revistas de porte médio tratando de música, e elas são sustentadas por gravadoras e promotores de shows -assim como revistas de bicicleta são sustentadas
por fabricantes de bicicleta e promotores de corridas.
Revistas de porte grande sobre
música, isso não existe. Um, porque mercados e gostos são hoje
segmentados. Dois, porque o que
se chama de revista grande de
música é a "Rolling Stone", que
trata música como um gancho
para tratar de comportamento,
celebridades etc. Três, porque
gostar de rock/pop internacional
é coisa de elite no Brasil, que hoje
já está bem atendida pela web e
pela MTV.
Folha - Há espaço para uma "Rolling Stone" brasileira?
Gasperin - Não sei se acredito,
mas, com certeza, torço para isso.
Gosto da idéia de achar na banca
um veículo em português sobre
cultura pop. Aliás, é preciso ressaltar: a "Rolling Stone" há muito
deixou de falar só de música. Suas
capas exibem estrelas de cinema,
da TV, modelos, enfim, ícones da
cultura pop. No Brasil, pop é TV.
Será que a gostosa da novela da
Globo seria capa da "Rolling Stone" nacional? Por que não?
Miranda - Com certeza. A mistura a que ela se propõe pode funcionar muito bem. Pop com conteúdo. Informação e crítica.
Texto Anterior: Música: "Acústico MTV" de Roberto Carlos sai dia 3 de outubro Próximo Texto: A crise dos 90 Índice
|