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São Paulo, sexta-feira, 12 de setembro de 2003

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"AS BICICLETAS DE BELLEVILLE"

Fábula de Sylvain Chomet prescinde de diálogos e busca sustentação na música

Animação francesa pedala entre grandes nomes de sua cultura

ALEXANDRA MORAES
DA REDAÇÃO

Com a sequência inicial de "As Bicicletas de Belleville", Sylvain Chomet poderia se redimir de qualquer deslize posterior do filme. Felizmente, não é preciso redenção. O primeiro longa-metragem do animador e quadrinista francês, diretor do premiado "A Velha e os Pombos" (97), começa passando a limpo personagens que povoaram a cultura francesa do último século, desde os traços -em leve homenagem ao caricaturista Albert Dubout (1905-1976)- às figuras de Django Reinhardt, Josephine Baker, Charles Trenet e Fred Astaire.
A abertura, na verdade, é um filme a que um menino melancólico, Champion, e sua avó, Madame Souza, assistem e em que se apresentam também as Triplettes de Belleville, trio musical fictício daqueles supostos anos 30. A sequência serve também como indício de que Chomet faz questão de explicitar as referências, que vão guiá-lo filme afora, até culminar num agradecimento ao cineasta Jacques Tati (1907-1982).
Personagens de traços angulosos recheiam a trama improvável, que parte da paixão do jovem Champion por bicicletas. O progresso entorta a casa dos Souza para abrir caminho a um trem, mas nada parece abalar a velhinha portuguesa, que se dedica a treinar o ciclista Champion.
Ele cresce, ganha músculos, um imenso nariz e vai participar da Volta da França, mas não completa a prova: é sequestrado por capangas da máfia francesa.
A partir do faro de seu cão Bruno -pavloviano de carteirinha-, Madame Souza vai atrás de seu neto, atravessando o Atlântico de pedalinho, numa sequência em 3D que talvez se revele o momento mais bonito do filme. A dupla chega a Belleville, mistura de Nova York e Montréal, onde a obesidade é a regra.
Cenas de perseguição e algum suspense são entremeadas pelos números musicais e instrumentos pouco ortodoxos das já decadentes Triplettes, que ganham o reforço de Madame Souza.
Durante todo o filme, não se ouvem palavras -apenas as do locutor da Volta da França e um discurso do presidente Charles de Gaulle (1890-1970).
Apoiado em seus traços, Chomet não precisa de nada além de boa música para dar tom à fábula. Exagera clichês sobre franceses (principalmente gastronômicos), brinca com seu quebra-cabeças de nomes famosos e passa a limpo suas referências mudas, sem precisar pedir licença nem desculpas.


As Bicicletas de Belleville
Les Triplettes de Belleville
    
Produção: França/Canadá/Bélgica, 2002
Direção: Sylvain Chomet
Quando: hoje, às 21h, e amanhã, às 15h, no MIS



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