São Paulo, Sexta-feira, 12 de Novembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"CORRA LOLA CORRA"
Uma aula de movimento retilíneo uniforme

PAULO VIEIRA
especial para a Folha

O pacote todo é bonito: edição com mais cortes que um videoclipe, música eletrônica alta, uma atriz de cabelos vermelhos e tatuagem tribal ao redor do umbigo. Fica nisso.
Lola (Franka Potente) tem 20 minutos para livrar seu namorado da pior, arrumando-lhe 100 mil pratas. Para isso correrá desesperada pelas ruas de sua cidade. Ao espectador cabe conhecer três diferentes possibilidades dessas corridas, uniformes, que levam a três desfechos diferentes.
Brincar com a narrativa não é prerrogativa do novo cinema alemão. Mas aqui, menos do que a construção de uma paisagem onírica ou a tentativa de diminuir os limites da mediação que toda narração impõe, o diretor Tom Tykner parece querer dizer "vejam como meus continuistas trabalham bem".
Também poderia ser a ilustração de uma aula de cinética ou a demonstração da teoria da causalidade. Porque não há um fim maior em "Corra Lola Corra". Há, aparentemente, um propósito em si mesmo, algo masturbatório, em que o diretor se satisfaz com nada mais que precisão cronométrica. Assim, dez segundos perdidos por Lola ao descer escadas levam-na a ser atropelada adiante; isso já não acontece na segunda corrida etc.
(Ou: a bola A transfere sua velocidade para bola B, mas, por insuficiente, não a encaçapa; na segunda tentativa a velocidade é demasiada, bola A e bola B caem; a "nega" na terceira chance?)
Pode-se alegar que "Lola" invoca grandes temas, um amor clássico, o lar destruído (Lola até tem tempo de saber que é filha adotiva e odiada). Mas tudo isso se subordina ao preciosismo de Tykner.
É paradoxal: para fazer um filme em que faz questão de dizer que um mísero dado do acaso pode levar a desfechos diferentes, Tykner parece ter seguido um roteiro e uma programação engessada, dignos de pesquisa científica, apenas mudando uma variável a cada experimento. Sem possibilidade da intervenção do acaso.


Avaliação:  


Filme: Corra Lola Corra Título Original: Run Lola Run Produção: Alemanha, 1999 (81 min) Direção: Tom Tykwer Com: Franka Potente, Moritz Bleibreu Quando: a partir de hoje, nos cines SP Market 6, Belas Artes Aleijadinho, Lumière 1, Cinearte 1

Texto Anterior: "Tango": Filme de Saura é belo e vazio
Próximo Texto: Ouça e corra -e vice-versa
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.