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HISTÓRIA
Onda de lançamentos se concentra nos atores da resistência ao regime brasileiro, seja com armas ou pela imprensa
Ditadura militar retorna às prateleiras
EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL
No ano em que se completam
três décadas da morte de Vladimir Herzog, os atores da resistência à ditadura militar no Brasil, seja na luta armada, seja no front da
imprensa, estão no foco de uma
onda de lançamentos que contemplam os anos que se seguiram
ao golpe de 1964.
Há desde uma edição ampliada
de "Memórias de Esquecimento",
que em 2000 deu o Prêmio Jabuti
ao jornalista Flávio Tavares, um
dos 15 presos políticos libertados
na "troca" com o embaixador
americano Charles Elbrick, até
um livro sobre o envolvimento do
regime no fim da Panair do Brasil
e uma compilação de reportagens
que mudaram os rumos do país.
"Vinte anos depois da posse do
primeiro presidente civil, estamos
chegando a um período mais
apropriado para discutir alguns
detalhes, temas mais sensíveis,
tanto para a direita como para a
esquerda", avalia Fernando Molica, que organizou com Marcelo
Beraba, ombudsman da Folha, o
livro "Dez Reportagens que Abalaram a Ditadura Militar".
Molica cita exemplos de trabalhos que abalaram o regime, como a cobertura do caso Riocentro
("o governo Figueiredo praticamente acabou ali"), feita em 1981
por Fritz Utzeri para o "Jornal do
Brasil". Ou o caso Delfin, em reportagem de José Carlos de Assis,
publicada na Folha em 1982.
"Esta aprofundava a discussão
sobre a possibilidade de negociatas com dinheiro público. Essas
matérias formam uma espécie de
agenda da sociedade civil naqueles tempos: direitos humanos, fome, corrupção."
Fundador e líder do Movimento
Revolucionário 8 de Outubro
(MR-8) e ex-líder da Vanguarda
Popular Revolucionária (VPR),
Aluízio Palmar dedicou 26 anos
de sua vida à investigação de uma
emboscada da qual quase foi vítima: em 1974, um grupo de exilados políticos, que viveu no Chile e
na Argentina, foi atraído de volta
ao Brasil, para uma falsa retomada da resistência armada. Dos sete
"convidados", apenas Palmar sobreviveu. A operação, conhecida
como Juriti, envolvia o recrutamento de agentes do próprio
meio da esquerda, a promessa de
logística e o fuzilamento dos militantes, a maioria deles no Parque
Nacional do Iguaçu. A história é
contada em "Onde Foi que Vocês
Enterraram Nossos Mortos?".
"Ao longo dessa busca, comecei
a reconstruir minha própria trajetória e a história das crises nos
grupos de ação armada, da opção
pela resistência pacífica e desta última tentativa de voltar às armas",
lembra Palmar.
Em "Náufrago da Utopia", Celso Lungaretti, que durante anos
foi tido como um delator, relata
seu envolvimento com a guerrilha, aos 18 anos, nas décadas de 60
e 70, para resgatar a memória de
alguns personagens esquecidos.
Segundo ele, à sombra de uma estranha tendência a se considerar
que os que optaram pelas armas
colheram o que plantaram.
"Acho deprimente que pessoas
pacíficas como Herzog tenham sido mortas. Mas há outros que os
jornalistas, que não concordavam
com a luta armada, não lembram.
É preciso lembrar que os militares
eram como uma tropa de ocupação, não muito diferente da que a
Resistência Francesa enfrentou
na Segunda Guerra. Lá, eles são
venerados; aqui, há uma vontade
de que essa página seja virada",
diz Lungaretti.
Em "Memórias do Esquecimento", Flávio Tavares acrescenta novos detalhes sobre a ajuda do
governo cubano à luta armada
brasileira, pelas mãos de Herbert
José de Souza, o Betinho.
"Nas edições de seis anos atrás,
lembrei que Brizola, ao voltar do
exílio, revelou ter recebido fundos
de Cuba, mas parei aí. Agora, retomo o tema em detalhes e conto
até uma cena hilariante do Betinho, ao chegar a Buenos Aires, na
volta de Cuba, quando maços de
dólares caíram ao chão no momento em que ele apresentou o
passaporte", adianta Tavares.
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