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"MONSIEUR N."
De Caunes realiza longa acadêmico
CRÍTICO DA FOLHA
Há muito tempo, na França,
circulava uma charge. Um
cineasta cercado por equipamentos e equipe, megafone à mão, dizia com segurança a respeito de
seu filme sobre Napoleão Bonaparte: "Desta vez vai ser um sucesso. No final, nós ganhamos".
O paradoxo de Napoleão é que,
embora derrotado, ajudou decisivamente a mudar o mundo. E o
insuportável, para nós, é imaginar
este homem, o mais talentoso general, reduzido ao exílio na remota ilha de Santa Helena.
É, de certa forma, a essas inquietações, à não aceitação pelos franceses da derrota em Waterloo,
que tenta responder "Monsieur
N.", de Antoine de Caunes. Ou
talvez fosse mais correto dizer que
a essas angústias o filme busca satisfazer, ou que ao vazio napoleônico ele busca preencher.
Esse vazio é, evidentemente,
muito mais acentuado entre os
franceses. E não será por acaso
que Napoleão, inconformado
com sua derrota na Rússia, lembra que seu sonho era a unificação
européia: "uma só lei, uma só
moeda" etc. Belo modo de sugerir
que a União Européia, tão sonhada por Charles de Gaulle (ninguém mais próximo de Napoleão
no século 20), é só um prolongamento do sonho napoleônico.
Para o filme, Napoleão ainda
não lutou sua última batalha: esta
se desenrola em Santa Helena e o
opõe ao governador inglês da ilha,
Hudson Lowe. Melhor não antecipar nada: digamos que envolve
hipóteses bastante fantasiosas sobre o destino do imperador francês, sem descartar especulações
sobre sua morte (por exemplo: teria ele sido envenenado?).
O roteiro tem o interesse de descrever a batalha de um homem só,
porém estrategista imbatível,
contra as circunstâncias que o
aprisionam. Ele não tem propriamente inimigo nesta batalha. Ou
antes, praticamente todos, de sua
"entourage" ou do exército britânico, são inimigos.
Mas para chegar ao fim dessa
última batalha o filme precisa
contornar uma série de obstáculos e criar uma série de personagens, cuja utilidade básica é desviar nossa atenção para que as
coisas se imponham como verossímeis.
Isso torna o filme muito longo,
embora esse não seja o seu principal problema, e sim o fato de estarmos aqui, novamente, diante
da velha "qualidade francesa":
aquele filme acadêmico ao extremo, capaz de agradar às velhinhas
parisienses, sem desagradar os
nostálgicos nacionalistas do império francês. É um público, é verdade. Mas não é daqui. Aqui o público-alvo é, em princípio, o de
apreciadores de belas paisagens.
(INÁCIO ARAUJO)
Monsieur N.
Idem
Direção: Antoine de Caunes
Produção: França/Reino Unido, 2003
Com: Philippe Torreton, Richard E.
Grant, Elsa Zylberstein
Quando: a partir de hoje, no Espaço
Unibanco 1
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