São Paulo, sábado, 12 de dezembro de 1998

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LITERATURA
Osvaldo Ferrari ganha na Justiça processo que o impedia de publicar os encontros com o autor de "O Aleph"
Diálogo inédito de Borges será editado

MAURÍCIO SANTANA DIAS
de Buenos Aires

Entre 1984 e 1985 Jorge Luis Borges recebeu a visita constante do jornalista e escritor Osvaldo Ferrari. A conversa entre os dois -sempre na casa de Borges- era gravada e transmitida pela Rádio Municipal de Buenos Aires, no programa "Diálogos de Borges com Ferrari".
Ferrari conta que, a pedido de Borges, o tema de cada diálogo só era conhecido na hora, para que a conversação não perdesse o frescor e o caráter de improvisação.
Esses encontros acabaram virando livros, que foram publicados não só na Argentina, mas também na França, Itália, Alemanha e Brasil ("Borges em Diálogo", Rocco).
Impedido de editá-los por muitos anos -desde que a viúva de Borges, Maria Kodama, moveu um processo contra ele-, Ferrari finalmente ganhou a causa na Justiça em outubro de 1997 e agora voltou a publicar seus diálogos com Borges, nos volumes "En Diálogo 1" e "En Diálogo 2".
Aos dois livros saídos neste ano, ambos reedições, se juntará um terceiro, a ser lançado em abril, "só com diálogos inéditos", anunciou Ferrari com exclusividade à Folha.
Folha - Como começou o processo que o impediu de publicar os diálogos por tantos anos?
Osvaldo Ferrari -
Minhas conversas com Borges tiveram muito êxito, e esse êxito, em vez de agradar a Maria Kodama, desagradou. Acho que o móvel do processo não foi tanto a questão dos "direitos autorais pendentes", que ela alegava; tratou-se de outro tipo de problema. De algum modo, a repercussão desses livros não lhe fez bem.
Folha - No ano que vem Borges completaria cem anos. Que atividades estão programadas?
Ferrari -
Em abril, na Feira do Livro de Buenos Aires, haverá um encontro internacional de escritores sobre Borges, além de um concurso sobre a sua vida e obra, do qual eu serei jurado. Nessa mesma ocasião será lançado um novo livro de diálogos, com mais de 25 conversas inéditas que tivemos em 1985. Esse livro ficou anos engavetado, aguardando publicação, por causa do processo.
Folha - Que critérios foram utilizados nas edições? Há cortes ou adaptações de estilo?
Ferrari -
Não. As edições são rigorosamente fiéis às gravações. O que se lê nos livros são transcrições integrais das conversas que tivemos, com todas as pausas e vacilações da língua falada. São a última fase da obra literária de Borges, que me dizia: "Não escreverei mais ensaios, mas o farei indiretamente, por meio de diálogos; enquanto falamos estamos escrevendo".
Folha - O que mais lhe chamava a atenção nos encontros com ele?
Ferrari -
A sua agilidade intelectual e o seu senso de humor. Ele era capaz de fazer as analogias mais surpreendentes, mas sempre a partir de um ponto de vista literário, fosse a conversa sobre budismo, história ou filosofia. Tudo se cristalizava em imagens literárias numa rapidez impressionante. Diante de Borges você tinha a sensação de estar diante de uma pessoa realmente genial. Penso que neste momento de grande confusão cultural e literária a lucidez de Borges faz uma falta enorme.
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Livros: En Diálogo 1 e En Diálogo 2 Lançamento: ed. Sudamericana, de Buenos Aires (tel. 00541/300-5400)




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