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São Paulo, quinta-feira, 13 de fevereiro de 2003

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"EXECUTIVOS"

Grupo Tapa tece com habitual sobriedade alegoria do poder

SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

Logo na primeira cena de "Executivos", Montparnasse, presidente de uma multinacional de armamentos, descreve para seu subalterno Bercy um quadro de Poussin, "O Tempo Resgata a Verdade dos Ataques da Inveja e da Discórdia", compartilhando assim com o público seu fascínio pelo gênero: a concretização crua de uma idéia abstrata. Imediatamente, assim, são apresentadas não só a questão central da peça -a verdade acaba prevalecendo depois de atingida pela calúnia?- mas também a sua forma.
De fato, a narrativa vai se desenhando em uma série de cenas curtas que mostram o desenrolar implacável, quase mecânico, de mesquinhas intrigas internas entre altos executivos.
O sensível e inseguro Odeon, responsável pelo orçamento de um armamento de alta tecnologia, se vê destruído pelo maquiavelismo de Denfert, que secretamente cobiça seu cargo, além de ter que conviver com a disputa entre Châtelet e Grenelle.
A ironia não está só no fato de a produção de armas ser apresentada quase que como pretexto para a disputa entre vaidades. O tom de alegoria vai se estabelecendo aos poucos através dos nomes -a empresa Delta Espace é um olimpo no qual o Todo-Poderoso (no Parnaso) depende do mefistofélico Denfert, que cuida dos contratos, e a interdependência dos opostos segue uma lógica implacável: todos os nomes são tirados de estações do metrô de Paris.
Para construir personagens ao mesmo tempo plausíveis e alegóricos, o diretor Eduardo Tolentino leva ao extremo sua habitual sobriedade. Em princípio, o texto caudaloso, quase verborrágico, faz temer um excesso de racionalidade francesa. Quase como um tema e variações, a intriga se estabelece sem pressa, mas, aos poucos, os personagens, nítidos como peças de xadrez, vão deixando transparecer um outro lado. Na hábil dinâmica do cenário, divisoras de vidro multiplicam reflexos, e o labirinto impessoal da arquitetura dos prédios de escritórios revela fantasmas e alçapões.
Assim, Hélio Cícero faz um Denfert assustadoramente contido. Norival Rizzo, pelo contrário, sabe trazer empatia ao seu abjeto Chatelêt, tirando risos a cada pausa, enquanto que a precisão de Zécarlos Machado (Montparnasse) e o carisma de Chris Couto (Grenelle) fazem contraponto à sensibilidade de Riba Carlovich, quando revela que seu submisso Bercy é o único que mantém a integridade. Em vão, pois seu patrão o força a reconhecer que também é vil, diante do quadro de Poussin: a verdade é reconhecida, mas não prevalece, e a alegoria de "Executivos" se faz clara e implacável.


Executivos     
Texto: Daniel Besse
Direção: Eduardo Tolentino
Com: grupo Tapa
Onde: Espaço Promon (av. Pres. Juscelino Kubitschek, 1.830, SP, tel. 0/ xx/11/3847-4411)
Quando: qui. e sáb.: 21h; sex.: 21h30; dom.: 19h; até 20/4
Quanto: de R$ 10 a R$ 30
Patrocínio: BR Distribuidora



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