São Paulo, Sábado, 13 de Março de 1999
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TEATRO - CRÍTICAS
Musical é o melhor da "maestrina"

da Reportagem Local

"O Abre Alas" não começa bem. Chiquinha Gonzaga abandona os filhos, e o enredo quer tornar o ato uma anacrônica revolta feminista. Sai de casa para morar com o amante, mas o enredo se esforça por eliminar o amor do ato, sublinhando opressão. O cume é a cena em que ela brada, como uma heroína, que vai lutar pela liberdade da mulher e do negro.
Mas que ninguém se deixe enganar: ainda no primeiro ato "O Abre Alas" entra nos eixos e passa a contar a história da "maestrina". Ela surge então apaixonada. E se descobre, já para o final, que sempre amou João Batista, por quem deixou os filhos, marido, pais.
Maria Adelaide Amaral, neste texto de 15 anos atrás, mostra o domínio que tem, desde sempre, do drama; no caso, adaptado ao musical. Deixadas as bandeiras, que tomam bem pouco de suas quase três horas, "O Abre Alas" se descobre um espetáculo raro em opulência visual, a lembrar um musical da Broadway, e sobretudo em envolvimento dramático.
A vida da compositora se revela verdadeiramente heróica, não por bravura de folhetim, mas por talento (suas canções estão lá) e pela persistência, pelas peripécias do amor e da busca de reconhecimento. É volúvel e grandiosa.
É um espetáculo de grande fausto, com "orquestra no fosso", como escreve o programa, orgulhoso; com cantoras de belas e possantes vozes; com coro de "girls". Mas são as canções, algumas desconhecidas e surpreendentes, que carregam a emoção do público.
Charles Moeller encena "O Abre Alas" em crescente comoção musical, obviamente levado também pelo texto, atingindo seu nó dramático no quadro da canção-título, que casa o teatro musical ao Carnaval, em apoteose.
Apoteose quebrada apenas, no final, por um brilhante golpe brechtiano: a exposição dos bastidores, das coxias, aliás, tão belos -e bem iluminados- quanto os cenários à vista do público. E nada mais oportuno: afinal, é de teatro, talento teatral, que se trata.
O talento de Rosamaria Murtinho, como Chiquinha, é o destaque. Como uma mistura de protagonista e corifeu, interpreta a própria história e guia o que acontece em cena. Salta com graça pelo tempo, da mulher à beira da morte para a menina. Domina o papel.
Alessandra Maestrini é sua sombra. É Chiquinha criança, a brincar com aquela que está para morrer. Não chega a ser uma personagem definida. É antes uma lembrança, a surgir volta e meia, com grande expressão gestual, mas guardada para a apoteose, quando solta a voz e comove de vez o público.
Selma Reis canta poucas vezes, mas expõe plenamente a qualidade da compositora e do diretor musical Cláudio Botelho. Valoriza a canção, o que é talvez a maior qualidade de "O Abre Alas".
No elenco de 20 atores/cantores, destaca-se ainda Cláudio Galvão, o João Batista, paixão de Chiquinha e responsável pelo primeiro grande quadro musical. No humor, neste drama com momentos cômicos, Marcelo Torreão é um impagável João do Rio. (NELSON DE SÁ)

Peça: O Abre Alas
Autora: Maria Adelaide Amaral
Direção: Charles Moeller
Com: Rosamaria Murtinho, Selma Reis, Alessandra Maestrini, Monique Lafond, Rosana Garcia e outros
Quando: qui. a sáb., às 21h; dom., às 19h
Onde: teatro Alfa Real (r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel. 011/5693-4000)
Quanto: R$ 20 a R$ 35
Patrocinadores: Telerj, Casas Bahia e Rio Sul



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