São Paulo, terça-feira, 13 de abril de 2004

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MÚSICA

Em reportagem do "New York Times", compositor critica o país e os EUA; artista toca no Carnegie Hall nesta semana

"A vida no Brasil é horrível", diz Caetano

DA REDAÇÃO

O cantor e compositor Caetano Veloso, 61, que acaba de lançar o CD "A Foreign Sound", composto por canções em inglês, foi tema de reportagem do jornal "The New York Times" publicada na edição de anteontem.
No texto, assinado por Jon Pareles, um dos críticos mais conhecidos dos EUA, o músico faz análises sobre os norte-americanos ("vocês têm uma vocação para dominar") e os brasileiros ("a vida no Brasil é horrível em muitas maneiras").
"Vocês [norte-americanos] roubaram o nome do continente", diz Caetano. "Apenas os EUA e a África do Sul tomaram os nomes do continente, de uma maneira arrogante inconsciente."
"Dado o explícito escândalo racial que foi vivido pelos dois países, posso escutar ecos dessa decisão naquilo vindo depois: uma vocação para dominar."
O músico tece comparações entre os EUA e o Brasil, como o antigo uso de escravos vindos da África pelos dois países. "Matamos índios. (...) Compartilhamos aquele sentimento da América, que é o sentimento de novo mundo. Temos que pensar nesses problemas, mas acima de tudo abrir nossos corações para a beleza que foi criada nesses novos continentes, porque é uma nova experiência na civilização ocidental."

Vida no Brasil
A reportagem elogia a obra e o novo álbum do cantor, que, segundo Pareles, é "um dos mais graciosos e inovadores compositores do Brasil e do mundo". "Ele é aquela raridade de combinações, um artista profundamente autoconsciente que também segue seus mais alegres instintos. No mais autêntico estilo brasileiro, sua carreira tem misturado sedução e provocação."
Na entrevista, Caetano dá sua visão de Brasil para o crítico norte-americano. "A vida no Brasil é horrível em muitas maneiras, mas é bela também", diz o músico.
"Como nação, somos uma criança, tão grande quanto o continental Estados Unidos, talvez até maiores. (...) Somos muito misturados racialmente. Temos uma responsabilidade histórica de fazer uma coisa boa devido a essa particularidade."
O compositor baiano também faz previsões para o futuro do Brasil. "Mesmo se, no futuro, nós, como brasileiros, não fizermos nada e apenas continuarmos sendo pobres, desorganizados, dominados e corruptos, e desaparecermos lentamente na história -mesmo se esse sonho for apenas uma luz fraca no oceano da história, até agora ele está vivo e vivemos a intensidade desse ambicioso sonho."

Carnegie Hall
A reportagem diz que Caetano retorna nesta semana para Nova York, na condição de curador do projeto "Perspectives", da casa de espetáculos Carnegie Hall (que também abrigará a estréia de seu novo show). O brasileiro é o primeiro músico não-clássico a assumir o cargo.
Ao lado do americano David Byrne, Caetano escolheu artistas brasileiros para o projeto, como Afroreggae (amanhã) e Mart'nália (quinta). Na sexta, o músico apresenta seu "A Foreign Sound" e, no sábado, divide o palco com Byrne. "Perspectives" termina no domingo com a apresentação de Virgínia Rodrigues.
Sobre o novo álbum, que inclui regravações de músicas de artistas como Stevie Wonder e Nirvana, Pareles diz: "Para a maioria dos músicos do exterior, um álbum de covers seria uma tentativa direta de ser conhecido aqui (...). Mas "A Foreign Sound" é consideravelmente mais sutil: (...) uma meditação sobre o exotismo".


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