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São Paulo, domingo, 13 de julho de 2003

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Mais salas, menos tempo em cartaz: são as novas regras para o sucesso das superproduções

O maior filme de todos os tempos (da última semana)

Caio Guatelli/Folha Imagem
Cartaz de "Hulk", de Ang Lee, ocupa toda a faixada do complexo de cinemas Belas Artes


DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Não se fazem mais filmes como antigamente. Vivemos agora a temporada dos números, do filme mais visto da semana, da animação por computador de maior sucesso da história, do lançamento mais barulhento, da produção vista de ponta-cabeça que mais arrebanhou platéias etc.
Para começo de conversa, emplacar um filme entre os cem mais vistos do mundo custa hoje bem mais caro. Põe aí um mínimo de US$ 100 milhões. E, se render menos do que US$ 50 milhões no primeiro final de semana em cartaz nos EUA, ganha uma pouco glamourosa etiqueta: "fracasso".
Só para comparação, em 1977, "Star Wars", segundo filme mais rentável da história americana, custou US$ 11 milhões. Em maio deste ano, "X-Men 2", 43º no ranking do país, saiu pela "bagatela" de US$ 110 milhões. E isso ostentando um novo recorde no currículo, o do filme que estreou em mais cinemas ao mesmo tempo em território americano, com 3.741 pontos de exibição - quase 1.500 a mais do que a produção setentona de George Lucas.
E a corrida continua: depois dos US$ 85 milhões abocanhados pela sequência de "X-Men" nos três primeiros dias, "Matrix Reloaded" chutou a meta -já estratosférica- para os US$ 92 milhões. Tome "Todo Poderoso" (US$ 85 mi na estréia), "Procurando Nemo" (US$ 70 mi) e "Hulk" (US$ 62 mi) e já se percebe uma nova curva na indústria: quanto maior é a altura maior é o tombo.
Em sua segunda semana nos cinemas, o verdão rebatia seu próprio recorde -o de estréias no mês de junho- com outro: queda de 70% nas bilheterias americanas em menos de dez dias.
As continuações de "Matrix" e "X-Men" também desceram a ladeira no EUA, perdendo 50% de público de uma semana a outra.
"A queda é natural e tem relação direta com o número de salas de estréia, que vem crescendo. A lógica é explorar o mais rápido um filme para acelerar a cadeia de lançamentos em DVD e vídeo", afirma o diretor-geral da distribuidora Columbia Tristar Buena Vista Filmes do Brasil, Rodrigo Saturnino Braga, 49. "O cinema é só a vitrine. Hoje, 2/3 da renda mundial de uma superprodução vêm dos DVDs e da televisão."
No Brasil, contudo, a curva é menos acentuada. O índice considerado "normal" por distribuidores e exibidores gira em torno de 30% de queda entre a estréia e a semana seguinte, caso da maioria dos blockbusters da temporada, à exceção de "Hulk", decepção do ano para a cadeia de salas Cinemark, e "Todo Poderoso", a surpresa, lançada com apenas 45 cópias na rede -considerado modesto para um blockbuster.
"Não tínhamos muita expectativa sobre ele, já que Jim Carrey [protagonista de "Todo Poderoso"] causa muita aversão no público brasileiro. Mas o filme entrou bem nas férias e deve completar o mês de julho com mais de 4 milhões de espectadores", revela Ricardo Szperling, 31, gerente de programação da Cinemark.
"O Brasil não está preparado para lançamentos muito maiores do que os que já acontecem. "Homem-Aranha", lançado com 500 cópias no ano passado, tomou quase 1/3 dos cinemas do país, que são cerca de 1.600. É muita coisa. "Cidade de Deus" teve 150 cópias e um público de mais de 3 milhões", diz Szperling.
"O público não se engana. O que define o tempo que um filme fica em cartaz é a renda que ele faz. Se quisesse mesmo só os filmes cult, iria ver. Mas, em geral, é o inverso: a gente lança esses filmes com cópias demais", diz o diretor da Columbia, referindo-se à curta passagem do novo Spike Lee ("A Última Noite") por SP.
Leon Cakoff, 55, diretor da Mostra de Cinema de SP e sócio da rede de salas "mezzo independentes" Arteplex, à sua maneira, concorda. "O importante é que o hábito de ir ao cinema está retornando. Os filmes independentes sempre tiveram pouco espaço, mas, colocando-os ao lado das superproduções, a gente tem a chance de conquistar novas platéias", defende Cakoff.
Justaposição que poderia ser considerada surrealista alguns anos atrás, hoje, no Unibanco Arteplex do shopping Frei Caneca, as panteras de Hollywood e os marujos da animação infantil "Sinbad" convivem pacificamente com terroristas políticos de "O Que Fazer em Caso de Incêndio?" e com as bonecas do novo filme japonês de Takeshi Kitano.

Fogo de palha?
Nos Estados Unidos, todavia, o acúmulo de recordes e de bilheterias milionárias não significam ainda que a guerra esteja ganha. Mesmo antes do final da alta temporada, que vai de maio a julho, alguns analistas já prevêem o fracasso dos novos blockbusters em relação a 2002, ano em que "Homem-Aranha" conquistou US$ 114 milhões em seu final de semana de estréia e garantiu seu lugar entre os cinco filmes mais lucrativos de Hollywood.
Depois da crise dos últimos dois anos e meio no ramo, muitos estúdios acreditaram que 2003 seria o ano da virada e voltaram a financiar as grandes produções. Só no último feriado de 4 de julho foi lançada meia dúzia de filmes que, juntos, consumiram mais de US$ 1 bilhão para serem produzidos.
Em meio a enormes dívidas, a Vivendi Universal, de "Hulk", gastou US$ 87 mi para produzir "Seabiscuit", baseado na história real de um cavalo de corrida vencedor durante a Grande Depressão americana nos anos 30. Da nova safra, é um dos mais baratos.
O ""Exterminador do Futuro 3", continuação da rentável franquia dos anos 80 estrelada por Arnold Schwarzenegger e dirigida pelo diretor mais gastão da história do cinema americano, James "Titanic" Cameron, custou US$ 175 milhões -incluídas aí as passagens para o grandalhão fazer uma moral com a elite do cinema, no Festival de Cannes, e com os atiradores de elite do Exército americano, no Golfo Pérsico.
Mas, com US$ 28 milhões arrecadados em sua estréia, mal conseguiu exterminar "As Panteras Detonando", que faturou US$ 37 mi no primeiro fim de semana...


Colaborou Fernando Canzian, de Washington


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