Trilogia de discos comemora o "cinquentenário" do gênero, fenômeno de massa após gravação de Luiz Gonzaga

SYLVIA COLOMBO
Editora-assistente da Ilustrada

Ninguém sabe direito que idade tem o baião. É certo que já embalava e fazia dançar o Nordeste popular (das praias e do sertão) ao longo do século 19.
Hoje, um grupo de artistas, a maioria nordestinos, está comemorando o "cinquentenário" do estilo musical que já é ancião na música popular brasileira.
Explica-se: o CD "Baião: 50 anos de Poesia, Ritmo e Emoção", que será lançado em agosto em Recife, comemora o que alguns estudiosos, como o pesquisador e produtor pernambucano Raymundo Campos, consideram ter sido o primeiro registro fonográfico de um baião.
No dia 22 de maio de 1946, na gravadora Odeon, foi gravado "Baião" (leia a letra ao lado), composição do sanfoneiro e compositor pernambucano Luiz Gonzaga e do advogado e compositor cearense Humberto Teixeira, pelo conjunto vocal Quatro Ases e um Coringa.
Ou seja, há 52 anos.
"Dois anos foi o tempo necessário para captar recursos e concluir o projeto", diz o pernambucano Raymundo Campos, responsável pelo mesmo.
O disco é patrocinado pela Telpe (Telecomunicações de Pernambuco) Celular, por meio da Lei de Incentivo à Cultura do Estado de Pernambuco.
Campos trabalha há 20 anos com artistas de forró e baião. Hoje, tem uma empresa voltada ao apoio na captação de recursos junto às leis de incentivo estaduais e federais para promover projetos culturais. "Falta divulgação das leis de incentivo no Nordeste junto aos artistas populares, que geralmente são pessoas sem informação, provenientes de classes desfavorecidas. As leis são subaproveitadas aqui", afirma.
O disco reúne algumas das peças mais importantes do baião, interpretadas pelos instrumentistas da Orquestra Brasileira de Forró, formada especialmente para a gravação do disco. Na orquestra, figuram como "solistas" músicos como Hermeto Pascoal, Sivuca, Renato Borghetti, Oswaldinho, Dominguinhos e outros, além dos maestros Edson Rodrigues e Heraldo do Monte.
A maioria das músicas do repertório é de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. O grupo partiu de fonogramas originais do compositor e de anotações do mesmo.
Os arranjos são coletivos, de Dominguinhos, Camarão, Genaro e Arlindo dos Oito Baixos.
Segundo Campos, o conceito do disco é o de trabalhar o improviso em cada música já consagrada. "Foi o único requisito que fiz aos artistas durante a gravação, que valorizassem os solos como espaço de recriação", diz.
Cada artista pôde pedir o que achava necessário para melhor realizar a sua interpretação. Hermeto Pascoal, por exemplo, pediu uma orquestra de câmara, montada às pressas com músicos pernambucanos.
O CD será distribuido em concertos da orquestra no Nordeste. A princípio, o produto estará disponível para o mercado em Recife. O lançamento no resto do país ainda depende de um acerto com gravadoras que façam sua distribuição.
Com o disco, deve ser lançado também um livreto ilustrado, em português e inglês, com a história do baião. Faz parte do projeto ainda o lançamento das partituras desses clássicos tão populares para estudantes de música.
"Quero transformar esse lançamento num movimento de divulgação dos artistas do Nordeste", diz Campos. O álbum faz parte de uma trilogia, que será completada com outros dois discos: "Baião: 50 anos de Identidade Cultural", todo instrumental, e "Vozes da Seca", que reúne letras de poetas sobre o tema da seca.
O primeiro já foi gravado e está sendo mixado, enquanto aguarda a captação de recursos. Dele participa praticamente o mesmo elenco de instrumentistas do primeiro disco: Sivuca, Oswaldinho, Renato Borghetti e Hermeto Pascoal, entre outros.
A única diferença é que se trata de uma coletânea unicamente instrumental, voltada também ao mercado internacional.
O segundo, "Vozes da Seca", ainda não arrecadou recursos, mas já está gravado. O produtor quer apresentá-lo a patrocinadores que se disponham a reverter parte de sua renda para a abertura de poços no Nordeste.