São Paulo, Sexta-feira, 13 de Agosto de 1999
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Anotações de Hitchcock revelam método do diretor

LIA PIMENTA
especial para a Folha, em Nova York

O famoso controle total do trabalho de Alfred Hitchcock já pode ser observado passo a passo. O lançamento do livro "Hitchcock's Notebooks", organizado pelo teórico de cinema de Los Angeles Dan Auiler, mostra as diferentes etapas da criação de filmes do diretor, desde o roteiro até a pós-produção. O livro foi lançado pela editora norte-americana Avon Books e ainda não tem previsão de uma futura versão brasileira.
O autor teve um longo trabalho de pesquisa pelas anotações pessoais de trabalho de Hitchcock, doadas à Academia de Artes e Ciências Cinematográficas pela filha do diretor, Patricia. Com comentários e muito material, Auiler tenta reconstruir a forma de trabalhar do mestre do suspense, começando pela construção do roteiro.
Ele mostra que muitas idéias partiam do próprio diretor e eram desenvolvidas por ele mesmo e sua mulher, Alma. Depois, alguns roteiristas eram chamados para a lapidação do roteiro.
As várias versões da cena final do filme "Suspeita", de 1941, estrelado por Joan Fontaine, podem ser encontradas no livro. O curioso é que em uma versão o marido da personagem principal termina como vilão, e, na outra, ele se redime e é perdoado. Ninguém sabia qual seria a versão final até poucos dias antes da filmagem.
Hitchcock também gostava de se basear na literatura, como em "Rebecca, a Mulher Inesquecível" e em "Os Pássaros". Mas, no caso de "Intriga Internacional", a idéia veio por um caminho totalmente diferente. O argumento do filme foi sugerido por meio de cartas por um jornalista de Nova York.
Também sempre se comentou muito sobre a interferência dos produtores na época áurea dos grandes estúdios de Hollywood. O livro mostra claramente, por meio de memorandos e cartas, o poder dessas pessoas nos filmes de Hitchcock. O diretor normalmente administrava bem as intervenções, mas, em alguns casos, a briga ficava feia.
Em "Um Barco e Nove Destinos", de 1943, Darryl F. Zanuck, o cabeça da 20th Century Fox, escreveu um memorando a Hitchcock criticando o roteiro do filme e a grande quantidade de diálogos. A resposta foi curta e grossa. Ele respondeu que nunca havia escutado tanta besteira em sua experiência cinematográfica e que as críticas eram baseadas em informações ridículas. No final, o filme acabou ficando ao gosto do diretor.
Depois do roteiro, Hitchcock continuava se envolvendo e controlando todos os aspectos da produção de seus filmes. Discutia com os estúdios a escolha dos atores, mas nem sempre conseguia emplacar os de sua preferência (leia nesta página). O livro ainda contradiz a fama de ele não se envolver muito com a direção dos atores.
Uma longa conversa gravada com Tippi Hedren, a atriz do filme "Os Pássaros", mostra o profundo interesse de Hitchcock no desenvolvimento do personagem (leia nesta página).
Os tão famosos storyboards não poderiam faltar. O diretor aprendeu a desenhar bem desde jovem, quando trabalhou em uma agência de publicidade. Ele fazia questão de storyboards para as principais cenas de suspense.
No livro podem ser vistos desenhos de seu próprio punho para "Os 39 Degraus" e os storyboards idealizados por ele, mas finalizados por outros artistas, das clássicas sequências de perseguição no milharal em "Intriga Internacional" e do ataque na escola em "Os Pássaros".
Hitchcock realmente preparava tão detalhadamente seus filmes, que, na hora da filmagem, não tinha muito trabalho. Mas, depois, se envolvia profundamente na pós-produção. Mandava cartas detalhadíssimas para os montadores explicando exatamente os pontos de cortes e, para os sonoplastas, cada momento de introdução de sons.
Foi assim que acabou brigando com seu grande contribuidor de trilhas sonoras, Bernard Hermann. Hitchcock não gostou da trilha feita para o filme "Cortina Rasgada", de 1966, e acabou rompendo a parceria (leia abaixo).
As anotações reunidas por Dan Auiler são bem específicas. É para quem gosta de cinema e se interessa pela técnica na confecção de um filme. Um prato cheio para hitckcockmaníacos.


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