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"ROSAS E PEDRAS DE MEU CAMINHO"
Florilégio de golpes e contragolpes
GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
Passados quase 25 anos da
morte de Carlos Lacerda, é
difícil comentar um livro dele,
originalmente artigos publicados
na revista "Manchete", em 1966,
sem que venha à baila o que não
está no texto, isto é, sua atuação
na história do Brasil, sobretudo
tramando contra os presidentes
Getúlio Vargas, Juscelino Kubistchek e João Goulart.
E, nesse aspecto, não é possível
neutralidade axiológica: ou se é
favor ou contra.
Relevando o fato de que, como é
o caso deste livro, "Rosas e Pedras
de Meu Caminho", o texto muitas
vezes contradiz a ação. Por exemplo: sempre soube-o antinacionalista, mas nesses escritos ele se declara simpático ao nacionalismo,
"uma força poderosa que será impossível neutralizá-la".
Citando sempre como fonte de
autoridade os brasilianistas e os
historiadores norte-americanos.
Não por acaso sua biografia será
feita pelo norte-americano Fuster
Dulles; de resto, o partido político
a que esteve filiado Carlos Lacerda, a UDN, era no fundo a visão
norte-americana do Brasil.
"Terra em Transe"
Antinacionalismo é o que explica o seu ataque violento ao Iseb,
Instituto Superior de Estudos
Brasileiros, que reunia intelectuais como Álvaro Vieira Pinto,
Roland Corbusier e Nelson Werneck Sodré, assim como se explica
sua perseguição ao cinema novo
de Glauber Rocha, tanto que o cineasta o colocará em "Terra em
Transe" no papel do alucinado e
histérico ditador Diaz, representado pelos pitis e esgares do ator
Paulo Autran.
Para Glauber Rocha, o transe de
direita de Carlos Lacerda estava
entronizado no colonialismo
"made in Roluidi".
Debalde tentei nesse livro encontrar explicação à travessia de
um Lacerda de esquerda para um
Lacerda de direita embora ele ironize que foi expulso do partidão
sem nunca ter nele entrado.
Leu precocemente o "ABC do
Comunismo", de Bukharin, aos
12 anos, mas confessa que não o
leu por inteiro; aliás o que ele escreve sobre Marx e o marxismo é
bastante superficial. Coisas do tipo: Marx era "conservador" porque gostava de Balzac.
Castelo Branco
Em 1966 Lacerda estava empenhado em articular a Frente Ampla com Juscelino e Jango, de modo que sua visão do passado mudou, tecendo agora elogios a Getúlio Vargas, que atrasou a democracia, mas progrediu socialmente o Brasil, assim como desceu o
sarrafo no marechal Castelo
Branco por ter se prolongado no
poder.
Daí a situação paradoxal de Lacerda: articulador do golpe de 64
que, por sua vez, cortou-lhe a possibilidade de ser presidente da República.
Foi a favor da interrupção do
processo democrático com a derrubada de João Goulart, mas se
indispôs logo a seguir com a ditadura de Castelo Branco, sobre
quem diz cobras e lagartos nesse
livro, o qual, no entanto, não dá
nenhum sinal de arrependimento
por ter sido golpista em 1964, que
é o acontecimento mais trágico da
história do Brasil.
O pensamento político de Carlos Lacerda, se é que se pode falar
em tal coisa, é de fundo heteróclito em que entram alhos e bugalhos. Nesse livro ele quer amalgamar Vargas, Juscelino e a UDN
(União Democrática Nacional)
numa feijoada completa.
Ainda está para ser feita a análise psicanalítica de Carlos Lacerda.
Em 1956, Gondin da Fonseca, entusiasta de Freud e ao mesmo
tempo espírita e marxista, detectou-lhe duas forças paralelas: o
ódio ao pai e o complexo de castração.
Carlos Lacerda teria transferido
para Getúlio Vargas a figura do
pai. Discorde-se ou não dessa interpretação, mas o fato é que seu
pai, Maurício, que tinha uma atitude ambivalente de amor e ódio
em relação a Luís Carlos Prestes, é
o nome mais citado no livro, se
bem que sempre coberto de elogios, por Carlos Lacerda, jornalista que será lembrado pela sua capacidade sarcástica de colocar
apodos e epítetos nas pessoas,
além de ter sido um excelente
"mancheteiro".
Gilberto Felisberto Vasconcellos é
professor de ciências sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor dos livros "O Príncipe da Moeda" e "O
Cabaré das Crianças", entre outros
Rosas e Pedras de Meu Caminho
Autor: Carlos Lacerda
Editora: UnB
Quanto: R$ 45 (305 págs.)
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