São Paulo, terça-feira, 14 de janeiro de 2003

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TELEVISÃO

Festa do interior


TVs locais crescem com empurrão de anunciantes que passam a investir mais nos mercados regionais


LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Em meio a uma das piores crises de sua história, o mercado de televisão brasileira está diante de uma nova tendência: o fortalecimento das emissoras que não fazem parte do eixo Rio/São Paulo.
Juntos, os dois Estados ainda concentram mais de 60% do investimento publicitário de todo o país. O valor está acima, inclusive, dos 46% da participação de Rio e São Paulo no Produto Interno Bruto do Brasil (dado do IBGE).
No atual contexto de dificuldades financeiras, as emissoras regionais são vistas no setor como "salvadoras da pátria" potenciais e aumentam gradativamente sua participação no faturamento das grandes redes nacionais.
Essa valorização dos mercados locais é consequência de um amadurecimento do marketing, na opinião de Daniel Barbará, diretor comercial da agência DPZ.
"Hoje, a indústria automobilística, por exemplo, coloca mais verba em publicidade de varejo [veiculada regionalmente] do que em comerciais da fábrica [anunciados nacionalmente]. As grandes redes de supermercado também já fortaleceram mais as operações locais. É o mesmo caminho que as empresas de telefonia começam a seguir, privilegiando cada mercado", afirma Barbará.
"Publicitários e anunciantes estão percebendo que é importante considerar as diferenças regionais da audiência. O crescimento da TV principalmente, assim como o do Brasil, virá dos mercados regionais, menos ligados às bolsas e mais focados na produção", diz.
O movimento dos anunciantes já tem reflexos no faturamento das redes. No SBT, por exemplo, o crescimento da parte das afiliadas no lucro do canal foi de 90% desde 1998, segundo Júlio César Casares, diretor de rede. Ele diz que atualmente as afiliadas representam 29% da receita do SBT.
"Há uma força muito grande nos eventos regionais que era ignorada em outros tempos. Hoje, flexibilizamos a programação e chegamos a sacrificar os programas nacionais quando há algo importante a ser transmitido na região", afirma Casares.
Algumas afiliadas da Globo costumam ser exemplos do potencial de faturamento local. Entre elas, estão a EPTV, de Campinas (interior de SP), e a TV Bahia. A emissora de Salvador, neste ano, transmitirá localmente o Festival de Verão pela quarta vez, evento que demonstrou capacidade de agregar anunciantes locais de peso.
A Rede TV! também deve valorizar suas parceiras locais, principalmente para aumentar sua cobertura nacional. A emissora, que começou cobrindo 33% do país, conseguiu fechar 2002 com 90% e quer atingir 99% até 2004.
Em 2003, o canal tentará se aproximar de afiliadas da Bandeirantes e da Record que estão insatisfeitas com a programação religiosa das redes, levada ao ar em horários que poderiam ser oferecidos a programas regionais.

Projeto de lei
Empresários de TVs regionais acreditam que o crescimento das afiliadas poderá ser ampliado com a aprovação do projeto de lei de regionalização da TV, da deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ).
Em tramitação na Câmara, o projeto prevê que as redes tenham cotas obrigatórias de programas regionais na grade de programação. Com isso, a produção local poderia crescer e o faturamento das afiliadas, também.
A Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão) vê o projeto com ressalvas e é contrária às cotas obrigatórias.
Para a entidade, há muitas TVs pequenas que não teriam condições financeiras de produzir programa de qualidade. Uma maior distribuição da verba publicitária por região, na opinião da Abert, deveria ser uma consequência natural das demandas do mercado e não de uma imposição legal.
O projeto, de 1991, foi aprovado na Comissão de Ciência e Tecnologia no ano passado, com algumas alterações no texto. Neste ano, com o Congresso novo, a polêmica deve esquentar.

No mundo
Em emissoras de vários países, a programação está se tornando cada vez mais local, em um movimento semelhante ao que ocorre nas afiliadas brasileiras.
Assim como no Brasil, anunciantes começam a dar mais importância às demandas regionais de consumo. Como consequência, o espaço de enlatados, principalmente séries norte-americanas, foi reduzido, de acordo com o "The New York Times".
Outros motivos foram a alta do dólar e a aprovação de leis de proteção ao conteúdo nacional, que determinam cotas obrigatórias de programas locais para as TVs.
A mudança significativa, no entanto, foi a importância dada a pesquisas que mostram que o telespectador prefere assistir a produções regionais. A conclusão é chave: no fundo, quem muda a televisão é a própria audiência.


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