|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMENTÁRIO
HQs levaram cineasta à Vera Cruz
ÁLVARO DE MOYA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Certa vez, Rogério Sganzerla me procurou para fazer
um curta sobre quadrinhos. Tinha obtido um crédito para um
"table top" e lá fomos para a Jota
Filmes. Eu levava pilhas de livros
importados, revistas, álbuns, selecionando momentos importantes
da história dos quadrinhos.
Ele decidiu dividir o material
em dois curtas: "Comics" e "Quadrinhos no Brasil". Escolheu a trilha sonora em colagens criativas e
originais, como era típico de seu
estilo inovador. Veio, então, a melhor fase: a da Vera Cruz.
Sempre que entrava nos míticos
estúdios de São Bernardo, uma
planta exalava um perfume semelhante ao curry. As conversas
eram sobre alguém que devia
muito aos quadrinhos, como nós
dois: Orson Welles.
Discutíamos a presença do gênio no Brasil, na década de 40. Eu,
pessimista, dizia: se nem Orson
Welles conseguiu fazer um filme
no Brasil, quem somos nós?
Naqueles tempos era obrigatória a exibição de um curta nacional acompanhando todo filme estrangeiro, e o nosso ficou atrelado
a "Teorema" (1968), de Pasolini.
Todo mundo viu nosso curta, que
foi premiado em Manaus.
Em Lucca, no Salão de Comics,
levei uma cópia e pedi à embaixada brasileira que mandasse o filme para o Festival de San Sebastian (Espanha). Chegou um dia
depois do encerramento. O diretor do evento lamentou, declarando que teria ganhado um prêmio...Toda vez que cruzava com o
Rogério, me prometia uma cópia,
agora em DVD. Não cumpriu e eu
continuo sem rever o filme.
Juntamente com José Mojica
Marins e Ozualdo Candeias, Rogério Sganzerla completa o trio
mais radical, idiossincrático e
criativo do nosso cinema.
Se ele não tivesse sido cremado,
eu iria depositar no seu túmulo
uma flor com perfume de curry,
colhida nos campos da Cia. Cinematográfica Vera Cruz.
Álvaro de Moya é estudioso de quadrinhos, autor de "Vapt Vupt" e "O Mundo
de Disney", entre outros
Texto Anterior: Cinema: Canal Brasil examina a obra de Sganzerla Próximo Texto: Análise: "Reality shows" não substituem a ficção Índice
|