São Paulo, quinta-feira, 14 de fevereiro de 2002

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Trabalho evoca de dada à pop art

DO ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Jac Leirner diz ter "cabeça de pintora", algo que revela muito sobre seu trabalho. Surgida na década de 80, a mesma que assistiu ao surto do "prazer de pintar" do neo-expressionismo, a artista, formada em 1984 pela Faap, buscou suas referências não nestas águas, mas na geração brasileira anterior. Seus "mestres": Cildo Meireles, Tunga, Waltércio Caldas, José Resende. Escultores.
Mas Jac acredita que a escolha pela "pintura" é uma marca de seu trabalho legada pelo espírito de época, o mesmo que levou seus pares às telas.
O raciocínio cromático, de fato, está presente de maneira muito evidente nas séries em que acumula peças gráficas (sacolas, envelopes, cédulas de dinheiro), agrupadas por cor em escalas insuspeitas ou em séries monocromáticas. A pintora, aí, parece ganhar da vontade de escultora de outros trabalhos. Uma resposta de Jac Leirner sobre o assunto: "Tenho dificuldade de lidar com essas oposições". Um problema mais complexo do que simplesmente a velha dicotomia chão x parede.
A curadora Lígia Canongia endossa a tese pictórica: "Hoje muitas questões relativas à pintura estão sendo colocadas fora do suporte da pintura. É o caso. Se Oiticica virou a página da pintura no Brasil, podemos dizer que Jac Leirner continua esses questionamentos".
Numa série recente batizada "Hip Hop" (98) e exibida em São Paulo no ano passado, Jac Leirner parece agravar essa relação: são fitas adesivas de várias cores e procedências, formando um desenho linear sobre a parede. "Aparentemente é um procedimento plástico mais puro. Mas a contaminação continua no material", diz a artista. "Essas fitas adesivas estão em todo lugar."
A série ganhou esse nome devido ao diálogo que instaura com os "Boogie Woogie", série do pintor holandês Piet Mondrian, aqui renovados como "Hip Hop".
A história da arte é fonte primordial para Jac: seu trabalho dialoga, simultaneamente, com a pop art, o conceitualismo, o minimalismo e o dada. O construtivismo brasileiro foi ração diária, por meio da coleção do pai, Adolpho Leirner. Mais tarde, outro elemento importante foi a estética punk. "Essa coisa tosca, trash mesmo, foi muito importante na minha formação."
Para dar conta da complexidade de sua obra, a exposição "Ad Infinitum" se desdobra em uma publicação com mais de 150 reproduções de obras em 224 páginas.
O catálogo traz textos publicados nos últimos anos por críticos das mais variadas extrações e escolas: Guy Brett, Lorenzo Mammì, Lisette Lagnado, Agnaldo Farias, entre outros.
A curadora Lígia Canongia assina um texto especialmente para o livro, no qual tece comparações entre as operações de deslocamento de objetos banais realizadas pela artista e os poemas do francês Charles Baudelaire (1821-1867), que anunciam a idade moderna e a vida urbana. Assim como o poeta, Jac Leirner busca, na modernidade, os sinais que servem de fonte para seu trabalho. (RM)


AD INFINITUM. Mostra panorâmica da artista paulistana Jac Leirner.
Curadoria: Lígia Canongia.
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro (r. 1º de Março, 66, 2º andar, centro, Rio, tel. 0/ xx/21/3808-2020).
Quando: abertura para convidados, dia 18; até 28 de abril; de ter. a dom., das 12h30 às 19h30.
Quanto: entrada franca.


O jornalista Rodrigo Moura viajou a convite da organização da mostra

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