São Paulo, terça-feira, 14 de fevereiro de 2006

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CINEMA

Exibido anteontem, "A Prairie Home Companion" foi bem recebido pela crítica

Filme de Altman critica Bush e sai como favorito em Berlim

FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

Uma saraivada de críticas à política de George W. Bush surgiu de forma inesperada com o musical country e aparentemente banal "A Prairie Home Companion", de Robert Altman, que teve estréia mundial anteontem em Berlim. O filme já se tornou o favorito ao Urso de Ouro, segundo a crítica alemã, encabeçando as listas dos jornais locais.
"Acho que esse filme é subversivo porque ele trata de algo que, ultimamente, se perdeu nos Estados Unidos, que é o senso de humanidade e o humor. Basicamente fomos criados sem fronteiras, por alemães, irlandeses ou paquistaneses, somos tudo", disse a atriz Meryl Streep, na capital alemã. Já Altman foi ainda mais direto: "Eu não acredito que nós vivamos uma guerra nos EUA, mas sim uma campanha de bombas".
"A Prairie Home Companion", um programa de rádio transmitido ao vivo há 30 anos, aos sábados, basicamente com música country, é o tema do novo filme do octogenário Altman, como sempre composto por uma rede de personagens e, como sempre, com um elenco estelar. Agora, além de Streep, participam, entre outros, Woody Harrelson, Kevin Kline e Tommy Lee Jones. "Gosto de trabalhar com muita gente, pois, quanto mais gente para ajudar, melhor. E, se alguém falhar, outros podem auxiliar", afirmou o diretor, em Berlim.
O filme retrata uma imaginária última transmissão do programa, encerrado pois estaria fora de moda, pelo seu real apresentador, Garrison Keillor, mostrando não só o que ocorre no palco como também nos bastidores. Entre as surpresas da produção estão as qualidades vocais de Streep e Harrelson, fortes candidatos ao Urso.
"Fico muito orgulhosa em representar dessa forma os Estados Unidos, é um programa genuíno, ingênuo, do tipo que crescemos ouvindo", disse Streep, anteontem. A atriz, em seguida, contou que vai encenar "Mãe Coragem", de Bertolt Brecht, no Central Park, em julho, "pois é a peça mais antiguerra".
"A Prairie..." torna-se político "porque todo filme é político, mesmo que não fale de política", disse Altman, famoso por outra sátira política: "M*A*S*H*". Ainda segundo o diretor, "a arte reflete uma atitude, pois nós lidamos com o que acontece ao nosso redor, mesmo que a gente não precise comentar diretamente isso".
Harrelson destacou a forma como setores de Hollywood tem abordado a gestão Bush: "Há muita gente falando em Hollywood, creio que o que George Clooney fez com "Syriana" e "Boa Noite e Boa Sorte" é muito corajoso, e ele merece ganhar não só um mas vários Oscars por isso".

Vida dura
Enquanto o domingo foi marcado pela leveza de Altman, ontem o Festival de Berlim apresentou histórias de personagens em desespero. "El Custódio", do argentino Rodrigo Moreno, única produção latino-americana na mostra competitiva, trata do cotidiano do segurança de um ministro do Planejamento, um homem-sombra, sem vida própria.
Rubén, interpretado por Julio Chavez, é visto sempre esperando pelo chefe, e até mesmo, sendo desprezado por ele, em uma cortante crítica ao abismo entre camadas sociais na América Latina. Já o alemão "Der Freie Wille" (livre-arbítrio), conta a história de Theo (Jürgen Vogel), um homem que sai da prisão após ter cumprido pena por cometer vários estupros. Sua dificuldade em retornar ao estado normal da vida torna-se um pesadelo, mesmo conseguindo relacionar-se com uma jovem, que por ele se apaixona. Em ambos os filmes, livre-arbítrio é uma ilusão.


FABIO CYPRIANO viajou a convite do evento

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