|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTES PLÁSTICAS
Um dos remanescentes do neoconcretismo, artista de 88 anos abre mostra com pinturas do ano passado
Barsotti festeja casamento com geometria
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dos matrimônios mais duradouros dos quais se tem notícia
nas artes plásticas brasileiras está
festejando outro aniversário de
casamento. O noivo, Hércules
Barsotti. A noiva, a pintura abstrata e geométrica.
Ambos se conheceram nos anos
40, os dois bem jovens. Não se largaram nunca mais. Aos 88 anos,
Hércules ainda passa tardes prazerosas com a companheira em
seu apartamento na Oscar Freire.
É nessa mesma rua de São Paulo
que ele mostra agora os frutos
dessa união. A partir de hoje a galeria Sylvio Nery expõe 15 pinturas que o artista fez em 2001, com
formas geométricas e cor.
O dono da galeria, Sylvio Nery,
sobe as escadas e volta com uma
pintura de Barsotti dos anos 50,
dominada por quadrados pretos.
-O que há em comum entre
essa pintura e as que o sr. mostra
agora? "Simplicidade", responde
com a voz grossa que solta quase
tão poucas palavras quanto as escassas intervenções que faz em
suas telas. Simples. É essa a teoria
que ele oferece de sua arte.
Barsotti foi dos primeiros a fazer pintura abstrata geométrica
no país. Trabalhava no mesmo
diapasão dos artistas que fundaram o movimento concreto, nos
anos 50, como os ainda ativos
Luiz Sacilotto e Hermelindo Fiaminghi. Mas não entrou para o
grupo por decisão de Waldemar
Cordeiro (1925-73), o "líder" concreto. "Ele não gostava de mim."
Em 1960, o crítico de arte Ferreira Gullar veio especialmente do
Rio para convidar Barsotti e seu
grande parceiro, Willys de Castro
(1926-1988), a juntar-se aos neoconcretos, que tinham na linha de
frente Amílcar de Castro, Franz
Weissmann, Aluísio Carvão,
Lygia Clark e Hélio Oiticica.
Mesmo como "sucursal" paulistana dos articulados neoconcretos, donos de uma das teorias estéticas mais amarradas já feitas no
país, Barsotti não se deixou seduzir mais pelas idéias da arte do
que pelos pincéis e pelas tintas.
Um exemplo: começou o noivado com a pintura abstrata geométrica usando o preto e o branco;
casou mesmo foi com as tintas coloridas, que começou a usar nos
primeiros anos 60. Existem várias
teorias cabeludas do porquê disso. Acompanhe a de Barsotti.
"Usava a tinta óleo. Ela demorava
muito para secar. Então preferia
usar só o preto e o branco. Quando apareceu a tinta acrílica, que
secava mais rápido, comecei a
pintar com cores." Simples.
É com as mesmas acrílicas de
cores intensas, divididas em superfícies de formatos geométricos, que o artista se apresenta na
mostra de obras recentes.
O único elemento novo -e não
é uma exposição de novidade,
mas de coerência- é areia. Não
tão novo assim. Nos anos 50, Barsotti processava a areia de modo a
deixar apenas o quartzo, a parte
brilhante dela, iluminando sua
pintura em branco-e-preto.
Meio século depois, a areia volta
não como brilho, mas como textura. Ele cola em pequenas áreas
(geométricas, claro) uma camada
arenosa e pinta por cima. E só.
Com pequenas, minúsculas, alterações de rota, Hércules Barsotti
segue o caminho. Ele e a pintura
abstrata: geométrica e simples.
HÉRCULES BARSOTTI. Onde: galeria
Sylvio Nery (r. Oscar Freire, 164, tel. 0/
xx/11/3064-3086). Quando: seg. a sex.,
das 10h às 19h; sáb., das 10h às 13h. Até
14/4. Preços das obras: de US$ 8.000 a
US$ 15 mil. Patrocinador: Grupo Tejofran
Texto Anterior: "Um bonde chamado desejo": Cia. Livre realiza a vontade de uma geração Próximo Texto: Panorâmica - Literatura: Cony autografa hoje nova edição dos "Cadernos" Índice
|