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São Paulo, sexta-feira, 14 de março de 2003

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MUNDO POP CONTRA A GUERRA

Mobilização musical contra conflito remonta a anos 60

JON PARELES
DO "NEW YORK TIMES"

Sheryl Crow não disse uma palavra sobre sua opinião quanto à guerra contra o Iraque quando teve seu momento no horário nobre durante a entrega dos prêmios Grammy, tocando com Kid Rock, duas semanas atrás. Seus adereços falavam por ela, do grande sinal da paz que trazia ao pescoço à correia de guitarra onde se lia "nada de guerra". Foi um raro vislumbre, na mídia de massa, de algo que as pessoas que viveram nos anos 60 há muito vinham esperando: que a música tomasse posição contra a guerra.
Não temos guerra ainda, apenas ameaças e preparativos. Mas os cantores de protesto, como generais, revisitam as batalhas do passado, à procura de paralelos. Muitos deles estão pensando no Vietnã; em 1º de março, em Nova York, Pete Seeger e membros do Sonic Youth tocaram juntos em um show que usava como repertório o "The Vietnam Songbook", publicado em 1969. Eles e outros compositores que denunciam a guerra com o Iraque estão tentando acelerar a reação artística e política que demorou anos, não meses, a ganhar ímpeto nos anos 60. E eles querem abortar uma guerra, não se sublevar contra ela.
Será que uma canção de protesto já fez com que alguém mudasse de idéia? É impossível dizer. "Give Peace a Chance", de John Lennon, fez com que algumas pessoas pensassem duas vezes. Mas as canções de protesto genuínas, aquelas que tomam partido, em geral atingem pessoas que já concordam com as idéias que elas propõem. Sua função é mais oferecer slogans para servir como lemas de união entre os convertidos e convencê-los de que não estão sozinhos.
As novas canções de oposição à guerra estão virtualmente ausentes das rádios comerciais, onde boa parte dos programadores nem sequer sonharia em dividir ou alienar seus ouvintes. Em lugar disso, as canções surgem de várias fontes marginais no circuito do rock indie das universidades, na ala ativista do hip hop e entre os herdeiros dos cantores de protesto folk dos anos 60. Mas alguns astros que vendem milhões de discos começam a se unir ao grupo.
John Mellencamp gravou uma canção contra a guerra, "From Washington", para seu próximo álbum. "Não creio que haja muita chance de ouvir essa canção no rádio", disse ele.
Outros músicos estão regravando canções do passado. George Michael lançou uma versão da sombria história de guerra "The Grave", de Don McLean, para um vídeo exibido pela MTV Europa.
Menos de duas semanas atrás, uma coalizão de músicos tão dispares quanto Jay-Z, Dave Matthews, Fugazi, Lou Reed e Missy Elliott se formou sob o nome Musicians United to Win Without War (www.moveon.org), mas ainda não lançaram novas canções sobre o tema.
Poucos músicos de rock esperam que as canções contra a guerra recebam grande exposição nas rádios, que estão largamente consolidadas em duas redes nacionais, a Clear Channel e a Infinity. Mas é improvável que isso impeça os compositores de gravá-las. "Se as pessoas estão preocupadas com perder audiência, não vão conseguir mantê-la por muito tempo, de qualquer jeito", diz Mellencamp. "Elas não ficam no estúdio imaginando se ofenderão alguém. E se o fazem, deveriam ser programadores de rádio."
Mas o magnata do hip hop Russell Simmons alega que as estações de rádio não rejeitariam automaticamente um hip hop antiguerra que tivesse perspectivas comerciais. "Não acredito que exista uma mídia que controle o hip hop", disse. "Quando colocamos um disco de rap na rua, ninguém, George Bush nenhum, pode detê-lo, se fizer sucesso. Não precisamos de ninguém, jamais precisamos de ninguém para divulgar nossa mensagem."
Mas até agora não surgiu nenhuma canção contra a guerra que obtivesse sucesso tão impossível de deter. Em relação ao Vietnã, os preparativos contra o Iraque vêm sendo mais curtos.
Uma coisa é mais certa: uma guerra, comparada à sua perspectiva, rapidamente geraria mais canções de protesto. "Os amigos deles vão morrer", diz Simmons. "Eles escreverão essas canções."


Tradução de Paulo Migliacci


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