São Paulo, domingo, 14 de março de 2010

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"Galã" Zé Bonitinho completa 50 anos

O "perigote das mulheres" estreou em 1960, no programa "Noites Cariocas"

Papel mais marcante de seu criador, o ator Jorge Loredo, o personagem serviu de inspiração a dois filmes do cineasta Rogério Sganzerla

MARCO RODRIGO ALMEIDA
DA REPORTAGEM LOCAL

"Mulher para mim é igual parafuso: é no arrocho", diz o sujeito de topete, imensos óculos e delgado bigodinho ao se atracar com sua parceira de palco, nos estúdios do programa "A Praça É Nossa" (SBT). Na hora "H", no entanto, ele dá a desculpa que a plateia sabe de cor: já beijou 999 mulheres naquele dia e está com a boca mole.
Gravação concluída, ele recebe fortes aplausos. Há 50 anos a reação se repete quando Zé Bonitinho, "o perigote das mulheres" criado pelo comediante Jorge Loredo, entra em cena.
Antes mesmo de chegar à TV, o personagem já era um sucesso entre os amigos de Loredo. A inspiração para o papel veio do Jarbas, colega metido a garanhão. "O Jarbas era uma figura, cantava todas as mulheres, parava em frente ao espelho para pentear o bigode. Eu o imitava nas festas e as pessoas se divertiam demais."
Reação idêntica teve o público que presenciou a estreia de Bonitinho no programa "Noites Cariocas", na antiga TV Rio, em 1960. Logo de cara foram tantas as risadas que Loredo ficou incomodado: ninguém ouviu as piadas seguintes.
Loredo já era famoso no final dos anos 50 (interpretava o mendigo filósofo na "Praça da Alegria"), mas foi Zé Bonitinho que marcou definitivamente sua carreira, a tal ponto que ainda hoje é confundido com o personagem. "Houve uma época em que me incomodava ficar tão preso a ele. Até que um amigo me disse: "Chaplin morreu Carlitos, Mario Moreno morreu Cantinflas, e você vai morrer Zé Bonitinho". Então, paciência, né...".
Atração popular, o personagem ganhou fama de "cult" quando um jovem cineasta cabeludo apareceu de madrugada na casa de Loredo, o convidando para filmar, já no dia seguinte, uma ideia inspirada em Zé Bonitinho. O diretor era Rogério Sganzerla, e dessa parceria saíram "Sem Essa, Aranha" (1970) e "O Abismo" (1978).
"Rogério era um gênio. Não havia roteiro, ele anotava as ideias e criávamos a partir daí."
Prestes a completar 85 anos (7 de maio), Loredo continua atuando com prazer, mas não é em tom de piada que afirma ser um comediante por acidente.
Até a idade adulta, sua vida mais parecia um dramalhão mexicano do que uma chanchada da Atlântida (influência confessa de seu trabalho).
Ainda criança, machucou seriamente a perna esquerda. A dor constante, só curada na década de 70, fez dele um garoto introvertido e tristonho.
Aos 20 anos, por causa de uma doença pulmonar, foi internado num sanatório. O que parecia ser a tragédia final de sua vida foi, ao contrário, sua salvação. Incentivado pelos médicos, participou do grupo teatral do hospital e descobriu sua vocação.
Ao receber alta, um teste vocacional identificou tendência para "atividades exibicionistas". Loredo procurou uma escola de teatro, em busca de papéis "sérios", "Shakespeare e Tchekhov ". A contragosto, seu primeiro teste foi representar um monólogo cômico, "Como Pedir uma Moça em Casamento". Aprovado, adotou o riso como profissão.
Apesar do meio século de convívio com Zé Bonitinho, Loredo conta que nunca foi galanteador. Depois de três casamentos, vive hoje com uma companheira, e se diz um homem recatado. "O artista só pode representar aquilo que não é, no máximo aquilo que gostaria de ser. Se tivesse algo do Zé, não faria o personagem."
Confessa, no entanto, que já recebeu muitas cantadas por causa do personagem. Certa vez, depois de um show, uma fã convidou-o para uma noitada, mas com uma condição: que fosse de Zé Bonitinho. "Claro que não fui, né. Já imaginou, o Bonitinho e eu dividindo a mesma mulher no motel?", ri.


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