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LITERATURA
"Livro reflete esquerda auto-enganada"
da Equipe de Articulistas
Leia, a seguir, continuação da
entrevista de Marcelo Coelho.
(JOSÉ GERALDO COUTO)
Folha - Seu livro parece refletir
um grande ceticismo diante da situação do país e do mundo.
Coelho - Quando se faz um retrato desses, a idéia é mostrar que
está todo mundo preso nessa situação. Acho que o livro reflete o
que acontece agora no Brasil: uma
despolitização muito grande, uma
falta de alternativas.
A despolitização atual é curiosa
porque não é aquela inconsciência
cínica da classe dominante do século 19. É uma pós-politização, no
sentido de que, entre essas pessoas, todo mundo já foi do PMDB,
lutou pela democracia etc.
Objetivamente você não tem
mais nada a ver com a esquerda,
sua vida já é outra, mas você continua ligado imaginariamente à
campanha do Fernando Henrique
para o Senado em 78, ou a 84. Quer
dizer, o cara não se sente despolitizado, nem se sente de direita. Os
personagens do livro são assim, fazem parte dessa ex-esquerda, ou
auto-enganada esquerda.
Folha - Isso se reflete no modo
de narrar?
Coelho - Claro. A tendência do
narrador de se perder em digressões -sobre guardanapos, sobre
discos voadores etc.- atende a
meu gosto pela digressão, mas
também corresponde a essa falta
de eixo que acaba conduzindo tudo à frivolidade mesmo.
Folha - O livro tem muito de machadiano, no sentido de lidar com
as máscaras sociais.
Coelho - Sei lá se não é uma lição de casa bem feita. A estrutura
da narração, o ponto de vista do
narrador, o tipo de infração à lógica narrativa, talvez tudo isso corresponda àquela coisa machadiana de revelar a arbitrariedade da
classe dominante na própria arbitrariedade do narrador.
Procurei jogar com três discursos dominantes: o religioso, o econômico e o jurídico. No fundo, os
três são muito semelhantes, porque usam a lógica para chegar a
conclusões muito disparatadas. É
como se o discurso econômico hoje fosse a nova sofística religiosa.
Folha - Na literatura brasileira
atual, o que vê de interessante?
Coelho - No fundo, meu livro é
também uma crítica ao que vejo
como tendência dominante hoje,
Rubem Fonseca em diante, que é a
de fazer de toda história uma história policial. Mesmo no Bernardo
Carvalho, que eu acho muito bom,
parece que sempre tem de haver
uma trama sobre identidades que
se revelam, alguma intriga.
Folha - Outra tendência é a do
romance pseudo-erudito, ambientado no passado, eventualmente
mimetizando a fala da época.
Coelho - Não tenho a menor
paciência para isso. Não tive nem
com "O Nome da Rosa", que seria
a origem dessas duas coisas: o entrecho policial, por um lado, e a
erudição histórica. Aí me disseram
que "Aqueles Cães Malditos de Arquelau", de Isaías Pessotti, era melhor que "O Nome". Li 40 páginas e
não consegui ir adiante.
Aliás, Rubem Fonseca também
tem dessas erudições, de repente
começa a falar sobre todos os tipos
e marcas de facas. Não consigo
nem saber se aquilo é a sério ou é
piada. É como aqueles best sellers
sobre aeroporto, hotel etc. O leitor
saía do livro sabendo tudo sobre o
assunto. Tem algo de professor de
cursinho nisso tudo.
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