|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTES PLÁSTICAS
Retrospectiva do artista começa amanhã no CCBB do Rio
Waltercio Caldas expõe razão e sensibilidade
CRISTIAN KLEIN
DA SUCURSAL DO RIO
A essência da obra de Waltercio
Caldas, 54, concebida nos últimos
anos -período em que a carreira
do artista decolou internacionalmente-, é tema da retrospectiva
que o CCBB (Centro Cultural
Banco do Brasil) do Rio inaugura
amanhã.
"Waltercio Caldas 1985-2000" é
a primeira mostra com caráter retrospectivo do escultor, que é um
dos pilares da arte contemporânea brasileira e expoente da arte
conceitual dos anos 70.
Caldas atualiza o público, exibindo uma seleção de 55 obras,
escolhidas pela curadora Ligia
Canongia, formada por esculturas, livros-objetos, desenhos, uma
aquarela, maquetes de obras públicas, seis cadernos de anotações
e uma série de trabalhos inéditos.
"Nos últimos anos tenho realizado muitas exposições fora do
país, e muitos trabalhos não foram vistos. Tenho a vontade de
nunca desvincular minha prática
artística do Brasil", diz Caldas.
O artista preferiu conceber a retrospectiva como a exibição de
um processo de trabalho que está
sendo realizado, e não uma visão
passadista sobre sua obra. "O que
faço é um trabalho só, que se modifica o tempo todo."
E por que a escolha de 85 como
marco? O artista explica que esse
ano, de certa forma, é um divisor
de sua carreira.
"Foi importante para mim,
quando voltei ao Brasil depois de
ter morado um ano em Nova
York. Estava cansado do pragmatismo americano. Apesar do mercado, comecei a apresentar minha
poética de forma mais radical. É
um período paradoxal porque,
justamente quando me desestimulei da carreira internacional,
ela começou a decolar um ano depois", afirma.
Caldas já representou o Brasil
nas principais mostras de arte do
mundo: na Documenta de Kassel
(Alemanha), em 1992, e na Bienal
de Veneza (Itália), em 1997. Duas
peças suas fazem parte da coleção
do MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova York): "Desenho
Japão", de 1972, e o objeto "Espelho com Luz" (1975).
A elegância é uma marca de seu
trabalho, em estruturas que, às
vezes, combinam o uso da transparência (por meio do vidro), da
matéria (metal e madeira, por
exemplo) e do espaço vazio, que
parece ganhar uma fisicidade palpável, modelável. Nas esculturas
de Caldas, matéria e não-matéria
podem ser uma coisa só.
"Uma das características do
meu trabalho é que o processo de
aparecimento dele é muito crítico. Tenho todo um ponto de vista
a respeito do fato de que, quando
um objeto é visto, ele é perdido
para sempre pelo olhar. Você vê
um objeto, e ele deixa de ser um
objeto possível para ser um objeto
existente", diz o artista.
Daí o esforço de Caldas para
que seus trabalhos nunca sejam
perdidos pelo olhar e necessitem
sempre uma observação mais
atenta. Entre os artifícios utilizados, está o exercício da dúvida.
Ele cita um episódio em que
uma criança, ao observar a "Série
Veneza", se aproximou, passando
a mão sobre o que pensava ser
uma superfície de vidro, uma vez
que esse material também faz
parte de outros planos da obra.
Com sua curiosidade de criança,
o garoto descobriu o vazio -uma
consequência do que Waltercio
Caldas chama de "aparecimento
crítico" de seu trabalho.
Esse limite entre o que se vê e o
que não se vê é um reflexo da arte
cerebral e, ao mesmo tempo, poética do artista. Filho de um engenheiro, Caldas procura a síntese
da razão com a sensibilidade.
"Pensar é emocionalmente e
muito mobilizador. Nunca fiz distinção entre pensar e me emocionar. Sempre vi isso muito interligado. Quando você vê a fotografia
do Einstein (1879-1955) de língua
de fora, você sabe o que ele está
querendo dizer. A razão é um dos
mais agradáveis delírios", afirma.
Caldas afirma não temer sobre a
possibilidade de sua obra ser confundida com design. "Quem responde isso de uma forma muito
irônica é [o escultor suíço" Giacometti (1901-1966). Ele diz que para
você reconhecer um objeto de design e um objeto artístico é muito
simples. O objeto de design é
sempre perfeito. O objeto artístico será sempre imperfeito e nunca terá que responder a uma função. A arte tem muitas maneiras
de demonstrar sua autonomia."
A exposição de Waltercio Caldas no CCBB contará com a maquete de uma escultura que ele fez
para a lagoa Rodrigo de Freitas,
em homenagem a Tom Jobim
(1927-1994), a pedido da família
do músico. O projeto ainda depende de uma negociação com a
prefeitura, que já dura cinco anos.
Entre os trabalhos inéditos, se
destaca uma homenagem ao pianista americano Thelonious
Monk (1917-1982). A peça, de
1998, tem uma estrutura de metal
sobre uma base de granito preto
onde se estende uma pele de coelho. "É uma homenagem à maneira como ele continuamente
criava um problema musical para
resolver no compasso logo depois", afirma o artista.
WALTERCIO CALDAS 1985-2000. Retrospectiva do artista Waltercio
Caldas. Onde: Centro Cultural Banco do
Brasil - teatro 1 (av. 1º de Março, 66, Rio,
tel. 0/xx/21/3808-2020). Quando: de
terça a domingo, das 12h às 20h; até 29/
7. Quanto: grátis.
Texto Anterior: Barbara Gancia: Apagão não rima com televisão Próximo Texto: Frases Índice
|