São Paulo, sábado, 14 de maio de 2011

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RÉPLICA "TITÍLIA E O DEMONÃO"

Crítico faz pouco de coletânea de cartas por não ser livro de ficção

PAULO REZZUTTI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Conta-se que um sujeito perguntou certa vez a um poeta: "Para que serve a poesia?". A resposta foi: "Para você, não serve para nada".
Em sua crítica ao meu livro "Titília e o Demonão: Cartas Inéditas de d. Pedro I à Marquesa de Santos", publicado pela Geração Editorial, Oscar Pilagallo escreveu (Ilustrada, 7 de maio) que a coletânea de 94 cartas pessoais de d. Pedro I, um dos maiores vultos da nossa história, "não traz novidades", e que elas não passam de "bilhetes triviais" de "interesse limitado". Historiadores e leitores têm saudado esses documentos como fontes primárias de grande importância para o conhecimento dos usos e costumes da época do Primeiro Reinado, bem como da psique invulgar do nosso primeiro imperador; para Pilagallo, elas nada têm a dizer, como a poesia a quem não lhe conhece a utilidade.
O historiador Alberto Rangel disse sobre a correspondência de d. Pedro para sua amante: "Recomenda-se a leitura de tais papéis meditáveis aos inquiridores da história, aos esquadrinhantes da psicologia, aos amigos dos documentos sugestivos e reais e aos que não se arrepiam de os saberem traçados na alcova de um paço imperial". O crítico, obviamente, não se enquadra em nenhuma dessas categorias.
Acusa-me de fazer uma abordagem estilo "Big Brother", só porque escrevi "vamos espiar" na pág. 79 (coisa dita até por coros shakespearianos), e repete tolices e clichês com as quais a República achacou a monarquia.
Acrescenta que comprei a palavra do imperador pelo "valor de face" -fazendo uso de um idiotismo inglês, termo que não existe na nossa língua fora do contexto econômico.
Minha abordagem não poderia ter sido mais cautelosa com relação aos "dogmas" da história oficial, tão caros a Pilagallo. Não só questiono a autenticidade da última carta da imperatriz d. Leopoldina como também ponho em dúvida diversas fontes da época, supostamente fidedignas.
Longe de comprar a palavra do imperador "at face value", sou o primeiro a rir da desfaçatez de d. Pedro ao escrever "não namoro a mais ninguém desde que lhe dei minha palavra de honra", ele, que fora amante da irmã da amante.
Mas a grande pérola do articulista, que demonstra o quanto entende do assunto, é: "Por serem lacônicas e redundantes, as missivas que vêm à luz não constituem um romance epistolar". Romance epistolar é um gênero de ficção, em que a ação dramática é narrada por cartas, como o célebre Ligações perigosas, de Choderlos de Laclos. Ou seja, Pilagallo não gostou do meu livro porque este não é ficção. Finalmente concordo com ele: "Titília e o Demonão" não é mesmo um romance.
Diz ele: "O autor escorrega na abordagem imprópria".
Impróprio é alguém escrever resenha sobre um livro cujo tema desconhece e ignorar a diferença entre documento histórico e obra de ficção.

PAULO REZZUTTI é autor do livro "Titília e o Demonão - Cartas Inéditas de d. Pedro I à Marquesa de Santos" (Geração Editorial).


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