|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"CARTAS DO BRASIL"
Edição reúne 177 correspondências do padre Antônio Vieira
Cartas registram construção do Brasil literário e político
RODRIGO PETRONIO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A primeira publicação das
cartas do padre Antônio
Vieira (1608-1697) data de 1735 e
consiste em cerca de 200 delas dispostas em dois tomos e levadas à
prensa pelo conde de Ericeria.
Mal esse volume saiu do prelo, começaram a aparecer cartas novas,
algumas apócrifas, redigidas por
escribas, em meio a outras, ditadas por Vieira ou assinadas de
próprio punho. Aos primeiros tomos veio se somar um terceiro,
compilado pelo padre Francisco
Antônio Monteiro em 1746.
Levando em conta cartas que
foram aparecendo em espólios
privados e antologias do jesuíta, o
estudioso português João Lúcio
de Azevedo leva a cabo, entre 1925
e 1928, a publicação do que poderíamos chamar de edição definitiva da correspondência desse autor que Fernando Pessoa definiu
como o "imperador da língua
portuguesa". Temos então uma
edição formada por 710 cartas,
dispostas em três tomos, anotada,
com estudo filológico e discriminação de fontes.
Foi com base nessa edição de
Azevedo que João Adolfo Hansen, professor de literatura brasileira da USP, organizou "Cartas
do Brasil", seleção de 177 cartas,
acrescida de um substancioso estudo introdutório, de notas, de remissões e resumo biográfico.
Os critérios de organização foram: temático, cronológico e
pragmático. Temático, porque focaliza os assuntos políticos relativos aos Estados do Brasil e do Maranhão e Grão-Pará, fornecendo
assim uma perspectiva geográfica
definida. Cronológico, porque,
recolhendo cartas do período que
vai de 1626 a 1697, abrange fatos
históricos da quase totalidade do
século 17 e de todas as fases da vida do jesuíta. E pragmático, porque se pretende uma reconstituição do ambiente onde a troca de
epístolas se deu e dos personagens citados nelas, sem o que seria
impossível muitas vezes até mesmo a compreensão do conteúdo.
Desse conjunto diverso sobressaem algumas. É o caso da famosa
carta "Ânua", de 1626, que relata
os sucessos da invasão holandesa
na Bahia. Há também a famosa
carta ao padre André Fernandes,
bispo do Japão, datada de 29 de
abril de 1659, e conhecida como
"Esperanças de Portugal". Nela
Vieira desenvolve sua interpretação profética (e heterodoxa) dos
versos do sapateiro Bandarra, que
viveu na região de Trancoso na
primeira metade do século 16, e
neles lê os sucessos futuros de
Portugal, motivo pelo qual foi
conduzido a responder a inquérito perante a Inquisição.
Mas sua correspondência não é
um registro positivo da história. É
uma arte. Por meio dela, lemos o
Brasil construído literariamente
por sua pena ao mesmo tempo
em que vemos o Brasil sendo
construído politicamente por sua
mão. Palavras, sementes e tintas,
com as quais se pinta o motivo
histórico e se implanta o Verbo.
Cartas do Brasil
Autor: Padre Antônio Vieira
Organizador: João Adolfo Hansen
Editora: Hedra, tel. 0/xx/11/3097-8304
Quanto: R$ 59 (670 págs.)
Texto Anterior: Literatura 2: Áudio do quinto livro de Harry Potter é divulgado na internet Próximo Texto: "Desmundo": Miranda expõe "pátria desimportante" Índice
|