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São Paulo, quinta-feira, 14 de agosto de 2003

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EXPOSIÇÃO

Museu Jeu de Paume apresenta 79 trabalhos do artista sergipano

Paris vê obras de Bispo do Rosário

DO "NEW YORK TIMES", EM PARIS

Sempre misterioso, o processo criativo torna-se ainda mais insondável quando o artista apresenta algum desequilíbrio mental. No entanto, a arte visual é uma forma de expressão que frequentemente atrai os doentes mentais. De fato, há mais de um século os hospitais psiquiátricos procuram compreender e tratar seus pacientes utilizando a arte como terapia.
Em 1950, o hospital Ste. Anne, em Paris, organizou uma exposição de "arte psicopatológica" vinda de 17 países. Posteriormente doadas ao hospital, as obras da mostra formaram a base de uma coleção que hoje inclui 70 mil objetos. Uma seleção de 117 deles pode ser vista na exposição fascinante intitulada "La Clé des Champs", exposta no museu Jeu de Paume, em Paris, até 28 de setembro.
Fazendo par com "La Clé des Champs" -uma expressão francesa que exprime a idéia de liberdade-, o museu apresenta uma retrospectiva mais inusitada ainda de 79 trabalhos de Arthur Bispo do Rosário (1909-1989), artista autodidata brasileiro que passou cinco décadas numa instituição carioca para doentes mentais.
Ao que tudo indica, Bispo do Rosário enxergava sua própria vida como missão de salvamento do mundo. Não há indício de que ele próprio visse seu trabalho como arte. Como paciente, se negava a participar das aulas de terapia artística.
Em dezembro de 1938, após oito anos na Marinha, teve uma visão de Cristo e sete anjos que o fez se apresentar a um mosteiro. De lá, foi enviado para um hospital, onde foi diagnosticada uma esquizofrenia paranóide. Ele acabou por ser internado permanentemente num hospital psiquiátrico do Rio.
"Bispo do Rosário se recusava a falar com os médicos e foi pouco a pouco se isolando cada vez mais, trabalhando compulsivamente", disse Agustín Arteaga, curador de arte mexicano que ajudou a organizar a mostra. "Era movido por considerações místicas, preocupava-se com o julgamento final, registrava tudo e todos com o intuito de garantir sua salvação."
É possível que o artista tenha simplesmente registrado o mundo tal como o enxergava, mas ele criou ordem onde havia desordem, beleza no lugar do lixo. Hoje, seria descrito como arte conceitual. Embora o conceito dele continue a ser um mistério insondável, seu trabalho é arte porque transforma o ordinário em extraordinário.


Tradução Clara Allain


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