São Paulo, sábado, 14 de agosto de 2010

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CRÍTICA HISTÓRIA

Jornalista reescreve o Brasil de modo juvenil

Leandro Narloch faz associações históricas provocativas, mas por vezes inadequadas e de frágil argumentação


LEANDRO NARLOCH TEM UMA TÉCNICA: EXAGERA OS ESCORREGÕES DA HISTORIOGRAFIA "POLITICAMENTE CORRETA" PARA VALORIZAR NOVAS INTERPRETAÇÕES


OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os tomates que o jornalista Leandro Narloch jogou na historiografia brasileira de viés marxista lhe renderam um prêmio.
Lançado no ano passado, o seu "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil" permanece na lista dos livros mais vendidos. Alguns tomates, para ficar na metáfora do autor, acertam o alvo.
A Guerra do Paraguai é retratada sem as distorções que, nos estertores da ditadura militar, transformaram o Brasil em impiedosa potência imperialista. Aleijadinho é corretamente visto como personagem cuja construção, em bases frágeis, perdurou por ter servido aos propósitos dos modernistas.
Nos dois casos, o mérito do autor foi ter se baseado em obras que fizeram revisões da história: "Maldita Guerra", de Francisco Doratioto, e "Aleijadinho e o Aeroplano", de Guiomar de Grammont.

DE ESQUERDA
O livro é todo assentado na bibliografia dos últimos anos que desfaz mitos, em geral os que promovem a leitura da história a partir de uma perspectiva de esquerda.
O jornalista, porém, pisa em alguns tomates. Ao escrever sobre os índios, embora registre com acerto que eles também se beneficiaram do contato com os portugueses, argumenta que o massacre de que foram vítimas começou nas guerras entre tribos.
Mesmo que mais nativos tenham morrido nessas lutas, a afirmação é descabida. Uma coisa é matar e morrer em conflitos entre iguais, outra é sucumbir diante de uma civilização tecnologicamente mais avançada.
As aproximações inadequadas são um problema. É muita ligeireza, até para quem se pretende provocador, associar, mesmo indiretamente, a ALN ao PCC (Primeiro Comando da Capital). A ALN, grupo guerrilheiro dos anos 60 e 70, nada tem a ver com o banditismo contemporâneo, por mais que se queira criticar a luta armada.
É igualmente inapropriado o paralelismo entre quilombo e máfia, mesmo que só para dizer que de ambos é quase impossível sair. Narloch tem uma técnica: exagera os escorregões da historiografia "politicamente correta", que subsistem sobretudo em certos livros escolares, para valorizar as novas interpretações.
Nessa toada, mistura argumentos sólidos e afirmações tão peremptórias quanto débeis ("os militares recorreram à tortura porque eram pouco experientes na arte de investigar"), escudando-se na ressalva de que quer apenas enfurecer leitores. De qualquer maneira, o autor presta um serviço ao remeter o adolescente -o público-alvo, a julgar pela linguagem- às obras em que se abasteceu.

OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de "A História do Brasil no Século 20"


GUIA POLITICAMENTE INCORRETO DA HISTÓRIA DO BRASIL

AUTOR Leandro Narloch
EDITORA Leya
QUANTO R$ 39,90 (320 págs.)
AVALIAÇÃO regular




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