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CRÍTICA CONTOS
Daniel Piza cria relato banal da vida em grandes cidades
Histórias têm sentenças filosofantes, tramas previsíveis e estilo sem graça
ALCIR PÉCORA
ESPECIAL PARA A FOLHA
"Noites Urbanas", do jornalista Daniel Piza, reúne
dez contos, quatro deles já
publicados em outros livros
ou revistas, e 18 minicontos,
histórias de um parágrafo ou
pouco mais, todos publicados na coluna "Sinopse", do
jornal "O Estado de S. Paulo".
O título, para fazer jus ao
conjunto, deve ser lido como
metáfora de escuridão, de
tempo sem saída.
Mais particularmente, trata-se de uma noite causada
por um curto-circuito entre
três fios desencapados: os
hábitos desumanizados da
cidade, encerrada em seu
próprio gigantismo; as redes
sociais virtuais, que aceleram o desgaste das relações
civis, e, enfim, a tecnologia
que tudo penetra, desorganizando as formas de vida.
As três situações enquadram o perfil da classe média
emergente, objeto do livro.
Até aí, tudo bem. O assunto dos emergentes e da virtualização do contato humano está mesmo escancarado.
A ironia de Piza ao tratá-lo,
contudo, inclui vários procedimentos mal sucedidos: da
imitação ostensiva do registro pedestre de suas personagens às comparações que
dão sempre precedência a
clichês e generalizações.
A fórmula usual é: "Ele era
um desses que..." ou "Não
era uma dessas que...", na
qual o típico e o caricato definem os personagens.
A combinação desses aspectos reduz o interesse da
narrativa a esboços de crônicas ou de alegorias.
E permanecem esboços,
pois, de um lado, são muito
gerais para funcionar como
crônica, que depende da
energia viva do particular; de
outro, não chegam a instigar
a interpretação como alegoria, pois são transparentes
demais para justificar o seu
emprego.
REPRODUÇÃO BANAL
Não terminam aí os problemas do livro. Há algum
patetismo na pintura da vida
dura dos pobres, sentenças
filosofantes ("Deve ser isto a
velhice, este retorno da insegurança da infância, já sem
os medos e as alegrias da infância"), intrigas previsíveis,
como a da história do zagueiro que já se sabe que vai acabar batendo no atacante talentoso ou a do velho artista
que se vê criança às vésperas
da própria morte.
Tampouco ajuda o estilo
jornalístico, de orações curtas e declaratórias, vez por
outra alongadas à custa de
apostos explicativos, pois tudo maltrata a frase.
Objetar-se-ia que a falta de
graça do estilo é parte do objetivo dos textos ao fazer a
crítica da banalidade. Não é
razão que justifique. De tanto
imitar o que critica já não se
sabe onde está a crítica em
meio à imitação.
Mostrar as caricaturas em
que as pessoas se transformam na metrópole terceiromundista precisa ser mais do
que a reprodução banalíssima do mesmo.
ALCIR PÉCORA é professor de teoria
literária na Unicamp
NOITES URBANAS
AUTOR Daniel Piza
EDITORA Bertrand Brasil
QUANTO R$ 33 ( 176 págs.)
AVALIAÇÃO ruim
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