São Paulo, sexta, 14 de agosto de 1998

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CRÍTICA
"Bernarda" sufoca Lorca

NELSON DE SÁ
da Reportagem Local

Acontece com "A Casa de Bernarda Alba", de Federico García Lorca, encenada por William Pereira, o mesmo que se viu em "Gata em Teto de Zinco Quente", de Tennessee Williams, encenada por Moacyr Góes -diretor de mesma geração.
Dois clássicos modernos, com temática de polêmica sexual na superfície, mas que, até por se tratar de autores de qualidade real, vencem nas relações humanas -ou poderiam vencer- a controvérsia datada. Com Williams, a qualidade se revelaria em montagens menores, em que atores se aproximaram de personagens.
"A Casa de Bernarda Alba", último e único texto em que o poeta espanhol deixou as formas mais ancestrais do teatro, como a tragédia de "Yerma", para entrar pelo drama moderno e hoje um pouco datado, é ainda assim uma bela peça.
O confronto de suas mulheres, as cinco filhas de Bernarda Alba (Nilda Maria), em torno de um só homem carrega ainda alguma coisa do primitivismo que o crítico Décio de Almeida Prado notou em "Yerma".
A (exageradamente sublinhada) virgindade ou não de Adela (Julia Feldens), a filha mais jovem, é o que menos interessa, é a superfície -a menos que se queira diminuir Bernarda Alba, a mãe, a uma repressora prepotente. Ou ainda, que se queira um panfleto contra a repressão sexual, na virada do milênio.
Mas no espetáculo do projeto Lorca na Rua, apresentado semana passada em São Paulo e agora pelo interior paulista, a primeira máscara é o que comanda, nas duas personagens citadas como nas demais, tornadas como que caricaturas.
É assim com a Angustias de Agnes Zuliani e com a Madalena/Amélia (papéis reunidos no espetáculo) de Mirian Rinaldi. Muito se explica, na interpretação frustrante de ótimas atrizes, reveladas em outros momentos, pelo conservadorismo da encenação.
"A Casa de Bernarda Alba" transferiu o palco italiano para um caminhão, para apresentações de rua. Em tal palco, fechou-se em si mesma, nas suas quatro paredes -que é, imagina-se, a visão do diretor para o texto. Uma visão formal, exterior, que acabou por sufocar as personagens e o próprio Lorca.


Peça: A Casa de Bernarda Alba Próximas apresentações: Palmital (hoje), Bauru (amanhã), Pindorama (dia 17), Santa Adélia (dia 18) Informações: 011/234-3000, r. 3081


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