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"Amores" é filme para ser amado
dos enviados a Gramado
"Amores", de Domingos Oliveira e Priscilla Rozenbaum, é um
filme cheio de arestas e ruídos,
desconjuntado como a vida. E
igualmente intenso. Exibido anteontem na mostra competitiva do
festival de Gramado, atingiu em
cheio a platéia, que chegou a
aplaudir durante a projeção.
A comédia aborda as complicações amorosas de um grupo de
personagens da classe média carioca esclarecida, tendo como eixo
o relacionamento entre Vieira
(Domingos Oliveira), roteirista de
TV cinquentão, e sua filha Cíntia
(Maria Mariana, filha do diretor).
O ambiente cultural em que a
história se desenvolve, o fluxo de
referências literárias e cinematográficas, a auto-ironia, a natureza
neurótica e loquaz do protagonista, tudo, à primeira vista, faz lembrar um Woody Allen à carioca.
Mas há pelo menos uma diferença essencial. Enquanto o protagonista dos filmes de Allen é apenas
uma "persona" do cineasta nova-iorquino, Domingos Oliveira
expõe a si próprio de uma maneira
radical, corajosa e comovente.
Não por acaso, cercou-se, em
"Amores", de seus amores reais: a
filha, a companheira (Priscilla Rozenbaum, atriz e roteirista), os
amigos, a própria casa.
O resumo acima pode dar a idéia
de uma egocêntrica sessão pública
de psicanálise, mas a auto-exposição de Oliveira é muito mais o caminho que ele usa para falar do
mundo que o cerca.
Pela neurose de Vieira passam os
grandes e pequenos dramas de
nosso tempo: a solidão, a Aids, a
confusão moral, a crise da cultura,
a dificuldade de manter crenças.
Como modo de sobreviver nesse
mundo confuso e inquietante, Oliveira e sua turma propõem a solidariedade, o carinho, o desejo. Em
uma palavra: amor.
Claro que, em decorrência de
sua proposta básica, o filme tem
irregularidades gritantes. Nada,
porém, que comprometa uma
proposta saudável: a de um filme
barato, de feitura rápida, pessoal,
e que pode ser visto com prazer
por qualquer platéia. "Amores" é
um filme para ser amado. Será?
Futebol e mulher
O outro filme da quarta, "Historias de Fútbol", é dividido em três
episódios. Fiquemos com o terceiro, em que o jogo se define a favor
do diretor chileno Andres Wood.
Ali, o diretor coloca em oposição, no início, o futebol e as mulheres, ao contar a história de um
jovem que, num fim de mundo, se
vê forçado a ver uma importante
partida na única TV da aldeia, que
pertence a duas solteironas.
Uma delas aproveita a chance
para atacar o garoto com ímpeto
digno de um Zamorano. E é aí que
Wood dá o seu bote narrativo, superpondo o futebol e o desejo e
harmonizando essas duas instituições. De quebra, faz uma comédia
bem dirigida, com atores (e sobretudo atrizes) formidáveis, em que
a mulher dribla a adversidade futebolística e busca nela inspiração
para instaurar outro jogo, o da sedução.
(IA e JGC)
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