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NINA HORTA
Reminiscências de um mexicanito
Foi a maior surpresa provar sua comida. Pimentões recheados, coisa que detesto, viravam algo precioso
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PASSAM PELO bufê vários cozinheiros interessantes. Uma
vez chegou lá, vindo não me
lembro de onde, um mexicaninho
-digo "inho" porque era miúdo- e
"flaco", simpático, de grandes olhos
aveludados. Lia muito, pedia livros
emprestados, queria conhecer o
Brasil e emprestava discos.
Casou-se com uma brasileira e daí
começou um dilaceramento. Morre
de saudades do México. Vai para lá, a
mulher não vai. Tem medo de ser
agregada à grande família dele e perder suas raízes. Há pouco tempo tiveram uma filha, milagre de Deus no
qual ele custa a acreditar. Adora a
menina e vai por São Paulo afora
procurando segurança (difícil na vida de um cozinheiro) e também sucesso e alegria. Quando a saudade
apertava demais, sumia para o México. Na volta, trazia pimentas, chocolates, ervas, ingredientes e umas
bolsinhas feitas à mão, bordadas,
aquela coisa bem mexicana, para
ajudar a pagar a viagem.
Confesso que foi a maior surpresa
provar sua comida. Pimentões recheados, coisa que detesto, viravam
o que há de mais precioso, com os
cuidados em retirar a pele, com os
temperos que se misturavam divinamente. Fazia um frango ao chocolate, de molho grosso, espesso, um
mole, semelhante ao nosso frango
ao molho pardo, só que com chocolate amargo. Coisas bobas, uma sobremesa de salada de frutas picadinhas, assada em folha de bananeira
(o difícil era dar e desatar o laço
que fechava o pacote...).
Enriquecemos com ele, nos ensinou muitas coisas. Um dia, bateu
asas para o México e, quando voltou, o lugar estava tomado. Ainda
ficaram muitos discos da Chavella
Vargas se esgoelando lindamente
para nos trazer lembranças dele.
Outro dia chegou um e-mail de
Campinas, de Enrique David
Calderon Obando (aranha73@hotmail.com).
"Eu sei, senhora Nina, não tenho
me esquecido da senhora. Primeiro me desculpa pelos meus erros
trágicos da minha escrita em português. Comenzei com um trailer
há pouco mais de um mês no centro da cidade de Campinas, com
comidas mexicanas, e tem ido bem,
graças a Deus. Também estou fazendo festas mexicanas nesta região. Ontem, fiz uma na Alphaville
de Campinas, que chique. Quem
podia dizer, he, he, he!!! Acho que
meu status social vai subir, já, já, já.
Ontem me ligou a Betty Kövesi para eu dar uma aula de cozinha mexicana. Fiquei muito contente. A
aula será no dia 23 de novembro.
Será que a senhora quer ir?
No princípio, tive alguns problemas com o trailer por as pessoas se
ressentirem quando viram meu sucesso e perceveron que o trailer comenzou a dar movimento e me mandaron tirar o trailer do lugar
todos os dias e levar para casa.
Eles sabem que não tenho carro,
então tive que colocar um engate
no trailer e me fazer de um carro
velho, para puxar o trailer todo dia.
Esse mês passado tive uma nuvem preta encima da minha cabeça, todo dia, e ainda por cima um trailer nas costas. A senhora há de
concordar que é muito peso. Espero que seja só o início, porque todo
mundo fala que no princípio é assim mesmo. Espero que os próximos dias sejam melhores.
La Isabella, mi hija, tá demais,
não pára, muito inteligente. Meu
pai vem em novembro para conhecer ela. Minha irmã vinha, só que
as passagens da Espanha para aqui
estão muito caras. Bem, dona Nina,
mais ou menos o que tenho feito.
Vou mandar umas fotos do trailer
nos próximos dias. E, cuando for
para São Paulo, vou pasar visitar a
senhora, um beiji e um abrazo, senhora Nina, bye."
Boa sorte, mexicanito, nada pode
dar errado na escola sob as mãos
mais que fortes e carinhosas da
Betty Kövesi. No dia 23 de novembro seu status vai começar a melhorar, sim, aposto. Bye.
@ - ninahorta@uol.com.br
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