|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CRÍTICA
Saxofonista fecha evento com show sem concessões
CARLOS CALADO
especial para a Folha
Foi um belo final de festival. Comemorando 70 anos, exatamente
na madrugada de ontem, o saxofonista Lee Konitz fechou o 12º Free
Jazz com um concerto inesquecível para quem aprecia o jazz sem
concessões.
Se, na noite anterior, Pharoah
Sanders tinha frustrado seus fãs,
por extirpar o jazz de vanguarda de
seu repertório, Konitz entrou no
palco do Bourbon para provar que
a chama da liberdade absoluta
continua viva no jazz dos anos 90.
Dizer que foi um concerto acústico não explica tudo. Radical, Konitz dispensou até mesmo os microfones para improvisar junto
com seu trio, que destaca o contrabaixo acústico de Mark Johnson e
a bateria de Jeff Williams.
Postado no fundo do palco, o rebelde saxofonista já dava a entender que muitas convenções do gênero não teriam vez no show.
De cara, Konitz inverteu o tradicional clichê tema/improviso/volta ao tema. Já abriu o concerto improvisando com liberdade total
uma canção conhecida, que a platéia só conseguiu identificar minutos depois, na última frase de seu
solo: "Stella by Starlight" (de
Young e Washington).
A inversão de papéis prosseguiu
no solo de Mark Johnson. Depois
de um breve improviso, finalmente, o contrabaixista apresentou toda a melodia da canção, provocando os sorrisos do público.
"Autumn Leaves" (de Mercer e
Kosma), número seguinte, tam
bém veio sem a apresentação do
tema, com Konitz explorando a região mais aguda de seu sax alto e a
bateria de Williams improvisando
livremente, sem qualquer preocupação em marcar o ritmo regular
(aliás, como tocou o tempo todo).
Outra clássica canção norte-americana serviu para um dos momentos mais inusitados do show.
Konitz pediu que a platéia entoasse por cinco minutos uma mesma
nota.
Sobre ela, improvisou "Alone
Together" (Dietz e Schwartz), incluindo uma suave exibição de
"scat" (vocais sem palavras). Já
em "Body and Soul", o fato de ter
improvisado mais próximo da melodia original parece ter animado
um gaiato, que começou a assobiar
a canção, no meio do público.
"Chega de assobio. Arrume sua
própria banda", cortou Konitz,
sem perder a elegância. O "set"
terminou com "All the Things
You Are"(Hammerstein e Kern),
numa versão típica do bebop mais
radical, em que a melodia foi solenemente jogada às traças pelo trio.
Quando já começava a tocar o
bis, foi Konitz o surpreendido.
Carregando um bolo de aniversário, Zuza Homem de Mello, assessor do festival, entrou no palco para homenagear o novo septuagenário, seguido pelo coro de "Parabéns a Você".
Por tudo que mostrou, no brilhante (e radical) encerramento do
Free Jazz, Konitz mereceria o bolo
e muitos parabéns, mesmo que
não fosse seu aniversário.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|