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São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 2003

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ARTES PLÁSTICAS

Para Barney, sua obra mais comentada teve trajetória "saudável", apesar da mudança de seu público

Trio elétrico será palco de debate político

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia abaixo continuação da entrevista com Barney. (FCY)

Folha - Foi de Lindsay essa idéia, já que ele tem fortes vínculos com a música brasileira?
Barney -
Ele me convidou várias vezes para ir a Salvador, e estive lá em 2000, pela primeira vez.

Folha - E como foi sua reação ao Carnaval baiano?
Barney -
Tenho muito interesse por esse contexto, no sentido de que os trios se movimentam pelas ruas, como em sistemas circulatórios, e quando esses trios se encontram é fascinante. Pode-se constatar que há vários níveis sociais numa celebração como essa, o que gera uma dinâmica interessante, especialmente para mim, que venho de outra sociedade.

Folha - Vários artistas brasileiros já realizaram obras a partir do Carnaval, como Hélio Oiticica. Você conhece o trabalho dele?
Barney -
Arto me mostrou coisas que aconteceram no Brasil do ponto de vista histórico, mas estou aprendendo, sou um novato.

Folha - Seu trabalho também vai além de contextos específicos da arte, você planeja usar essa experiência em Salvador em sua obra?
Barney -
Em primeiro lugar, pensamos nessa participação como uma performance em tempo real, mas vou estar filmando, fazendo um vídeo disso tudo e não tenho idéia do que irá surgir. São duas coisas diferentes: participar em um trio no Carnaval tentando fazer um trabalho em tempo real, mas também criar um filme no contexto do Carnaval.

Folha - Qual o tema do trio?
Barney -
Estamos trabalhando no tema, mas ele está centrado na imagem de uma grande árvore, que estará no trio. E haverá uma série de elementos, cuja narrativa irá refletir sobre questões ecológicas. Eu diria que é uma sobreposição de temas com uma questão política mais larga, que tem a ver com a atual situação política mundial. De certa forma, será uma maneira de ver questões ecológicas pontuais com imagens mais amplas tiradas do candomblé, de Ogum. Pretendemos criar um trabalho político com senso abstrato, propondo perguntas em vez de respostas.

Folha - Você poderia ser mais específico ao falar de questões políticas?
Barney -
Para mim será uma forma mais provocativa de ver como os seres humanos brigam, como continuam a realizar conflitos, apesar de criarem as Nações Unidas, por exemplo. Parece haver uma inabilidade dos seres humanos em usar os sistemas que eles criam numa forma democrática. Vivemos num momento difícil. Usar o candomblé é uma forma de meditar sobre nossa condição do ponto de vista da natureza.

Folha - E você acredita que a arte tem um papel nesses tempos difíceis?
Barney -
Acredito que a arte tem uma oportunidade única para servir como plataforma para o debate, já que ela não tem a necessidade de ser um manifesto concreto. Ela pode ser um elaborado e político diálogo que cresce de forma independente em uma obra de arte, o que acredito acontecer neste caso. Há muitos problemas políticos a serem questionados.

Folha - Em "Cremaster" você quis trabalhar com questões políticas?
Barney -
"Cremaster" foi mais como descrever uma paisagem interna e, apesar de ser uma obra acabada, funcionou de várias formas, ao longo de seu caminho. Ela tornou-se uma forma de diálogo sobre questões de gênero, o que não era necessariamente minha intenção original, mas é interessante quando uma linguagem abstrata se torna a plataforma para uma conversa mais específica.

Folha - "Cremaster" foi uma das obras mais faladas dos últimos anos, você esperava isso?
Barney -
Foram necessários dez anos de fato para a criação de "Cremaster", então ela teve uma vida bastante orgânica. Ela começou com um tipo de público muito específico e terminou com outro, mas isso de forma orgânica. Quanto mais cinemático se tornava o trabalho, mais audiência alcançava. De certa forma, no final, quando ele foi visto em retrospectiva, voltou a ser aquilo que era no início, ou seja, um projeto de escultura, o que foi muito satisfatório. Sobre o sucesso, o apoio ao projeto possibilitou seu crescimento, e isso foi muito saudável, pois ele cresceu como deveria.

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