São Paulo, quinta, 15 de janeiro de 1998.



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MÚSICA
Songbook do compositor é primeiro álbum do intérprete em sete anos; show de apresentação estréia hoje em SP
Noel Rosa quebra silêncio de Johnny Alf

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

É dessas raras oportunidades em que passa o cometa. Johnny Alf, 68, canta ao vivo de hoje a domingo, em São Paulo, para apresentar um novo álbum, todo dedicado à obra de Noel Rosa. Em 45 anos de carreira profissional, ele gravou apenas oito discos; não lançava um havia sete anos.
Reaparece num trabalho que é mais ou menos seu. O CD que integra o projeto "Letra & Música", idealizado por Almir Chediak, de songbooks -Tom Jobim, Chico Buarque e Ary Barroso já receberam os seus- interpretados por duplas de músicos.
Assim, piano e arranjos a cargo de Leandro Braga, os dotes de pianista de Johnny Alf são deixados de lado no songbook de Noel.
"Todo o projeto foi idéia do Chediak. Mas Noel, para mim, depois que fui obrigado a me aprofundar em sua obra, é o mais importante compositor brasileiro de todos os tempos."
Quem afirma isso é o artista que há cerca de quatro décadas carrega colado a si, como aposto, o epíteto de "precursor da bossa nova" -que continua se esforçando por afastar, ao menos verbalmente.
"Eu não participei do movimento, me mudei para São Paulo em 54, antes de a bossa explodir no Rio. Mas tinha algo a ver com ela, por isso fiquei marcado."
Seja como for, começou a se tornar artista frequentando o Fã-Clube Sinatra-Farney (criado para adorar o crooner-modelo Frank Sinatra e seu seguidor brasileiro Dick Farney), antro de formação de toda uma geração pré-bossa.
Seguindo os passos de Farney e Nora Ney -seus "padrinhos" musicais-, Johnny definia aí os pré-modelos da contaminação da MPB tradicional pelo jazz norte-americano. Por isso pode soar algo inusitado o mergulho atual em Noel, quase duas décadas anterior ao advento do samba-jazz (designação que Alf prefere à de bossa nova para definir seu trabalho).
Ele contesta a contradição. "Não há nada de estranho em eu cantar Noel. Sua melodia já tinha muita coisa de bossa nova", define, assumindo nas entrelinhas a filiação sempre refutada à bossa.
Para evidenciar o Noel Rosa melodista -intenção do projeto, fundamentada pela presença exclusiva de composições em que o artista fez música e letra-, Alf diz que optou pela fidelidade à obra.
"Canto jazzificando, improviso muito. Até tentei, mas não deu, fugiria muito da obra. Noel exige uma interpretação simples."
Para os shows que faz de hoje a domingo no Sesc Pompéia -que não contam com a presença de Leandro Braga-, Alf promete não só canções de Noel. Mostra, então, desde standards como "Eu e a Brisa", "Rapaz de Bem" e "Céu e Mar" até peças instrumentais.
Zomba do fato de "Eu e a Brisa" ser quase mais famosa que ele: "Essa música é famosa só porque foi lançada num festival". Refere-se ao festival da TV Record de 67, em que "Eu e a Brisa" foi desclassificada por novidades como "Alegria, Alegria", de Caetano, e "Domingo no Parque", de Gil.
De lá para cá, "Eu e a Brisa" ganhou incontáveis reinterpretações e Alf prosseguiu carreira constante nos palcos e errática em disco.
"Meu trabalho não é de mídia. Nem sempre é interessante para as gravadoras, que só querem os maiores sucessos. A mídia é muito desligada do meu trabalho", decreta, desinteressado.

Show: A Rosa do Samba Artista: Johnny Alf Onde: teatro do Sesc Pompéia (r. Clélia, 93, tel. 011/871-7700) Quando: de hoje a sábado, às 21h; domingo, às 18h Quanto: R$ 12


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