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Para autor, diversificação precisa ter voz
em Paris
Fuentes falou ainda de seu processo de escritura, sobre novas
mídias, como a Internet e das suas
projeções para o século 21, que espera ser o século do crescimento
da língua espanhola e da expansão do que considera "território
de La Mancha".
Para o escritor, há "elementos
de diversificação" nos Estados
Unidos "que precisam ter voz" e,
ainda segundo Fuentes, os políticos já começaram a compreender
que têm de usar a língua para se
aproximar dessas camadas tão diversas.
Leia abaixo a continuação da
entrevista de Carlos Fuentes à
Folha.
Folha - O sr. já disse não abrir
mão da velha caneta e papel para escrever, mas não acredita
que os computadores, a Internet em especial, possam ser instrumentos de criatividade e pluralidade cultural no próximo século?
Fuentes - Não sei mexer com
esses aparelhos, não uso a Internet nem o computador, eles não
têm asas como as de um livro.
Na verdade, as tecnologias não
são boas, nem más, tudo depende
do uso que se faz delas. Acredito
na possibilidade, por exemplo, de
que por meio da Internet um estudante do México possa conversar com outro da Costa Rica, Uruguai e assim por diante.
O problema com os computadores é muito próximo ao da televisão comercial. Há crítica de livros, cinema, arte, mas não há
uma crítica estruturada para analisar as novas mídias. Então é preciso que haja uma crítica dos
meios de comunicação modernos
e há de se democratizá-los entre
as mais diversas classes sociais,
nas escolas, como um meio educativo.
Folha - Sua correspondência
com o escritor Octavio Paz faz
parte da história da literatura, a
decisão de guardá-la a sete chaves é mesmo definitiva?
Fuentes - Isso fará parte da história da literatura dentro de 50
anos, depois de minha morte. Fui
a pessoa que mais a fundo conheceu Octavio Paz, um dos maiores
escritores de todos os tempos. Há
muitas coisas ali que só dizem respeito a mim e a Octavio, às nossas
querelas literárias, e elas serão divulgadas no momento certo.
Folha - "Los Años com Laura
Diaz" não foi traduzido ainda
para o português. O que o sr.
poderia dizer a respeito desse livro para os seus leitores no Brasil?
Fuentes - É basicamente a história de um país visto por uma
mulher. É também uma reescritura de meu livro anterior "A Morte
de Artêmio Cruz", só que neste
havia um ponto de vista tipicamente masculino, machista até.
Obviamente há aí também um retrato dos descaminhos da Revolução Mexicana.
Folha - Em "A Fronteira de
Cristal", recentemente lançado
no Brasil, o sr. critica o limite
imaginário entre EUA e México.
O México se reestruturou economicamente sobretudo com a
ajuda norte-americana, mas no
conto que dá título ao volume,
em que um rapaz mexicano e
uma publicitária norte-americana trocam olhares através de
uma janela, o sr. parece mostrar
que essa associação nem sempre é promissora, não é?
Fuentes - Em termos. Não
creio, por exemplo, que isso se
aplique aos demais países latino-americanos. Não há um país que
tenha a porção tão singular como
o México, que é vizinho dos Estados Unidos, um país em desenvolvimento, latino, mestiço, católico, vizinho da potência principal
do mundo, de cultura anglo-saxã,
protestante.
O que sucede é que dentro dos
EUA há elementos de diversificação que precisam ter voz. Não se
entende que não há só uma história, a história contada pelos brancos, anglo-saxã e protestante, há
também uma história afro-americana, uma história indo-americana, uma história latino-americana.
Isso, mesmo que inconscientemente, está gerando mesmo um
movimento que obriga os candidatos à presidência dos Estados
Unidos a falarem em espanhol
para atrair o voto latino, negro,
chinês, vietnamita, etc. É preciso
que haja um movimento que
apresente os EUA como um país
multicultural e não mais monocultural.
Folha - A referência histórica é
uma constante em sua literatura. Essa seria a verdadeira função da literatura?
Fuentes - A literatura não se
constrói no vácuo, tem uma relação com a história. Porém, não é
outra a verdadeira função da literatura a não ser manter o vigor da
língua e da imaginação.
Folha - E o próximo livro, qual
será?
Fuentes - Não digo nada, dessas
coisas não se fala antes de o livro
ter vida própria.
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