|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TELEVISÃO
Matheus e Guel Arraes, mágicos
TELMO MARTINO
Colunista da Folha
Se for de seu agrado, Fernanda
Montenegro pode levar para casa o
seu manto azul de Compadecida.
O que lhe foi pedido ela deu em dose maior e mais rica. De repente,
todos se mostraram muito mais
aquinhoados. Inclusive o já tão favorecido João Grilo e (por que
não?) o atarantado Chicó.
Quem tem memória e o tempo
necessário para exercitá-la nunca
se esquecerá da chegada do "Auto
da Compadecida" a um palco do
Rio. De repente, todos se deram
conta de que a roupa que aquele
cantor-sanfoneiro usava no palco
do Golden Room, lá no Copacabana Palace, era apenas uma fantasia.
O tema de suas músicas ganhava,
finalmente, os trajes adequados
para a pobreza e, principalmente,
o humor que Suassuna colocava
nas artimanhas dos personagens.
João Grilo sempre foi o rei de todos, principalmente pela generosidade com que trata seus intérpretes e também pela retribuição que
deles recebe. Só como homenagem, vale a pena lembrar a descoberta de uma nacionalismo na arte
de representar que o Agildo Ribeiro usou ao se colocar sob sua pele.
Matheus Nachtergaele (que maneira preciosa de identificar um talento que Goldoni beijaria da cabeça aos pés) é uma felicidade em todas as suas estripulias sempre engraçadas. É uma invenção toda
pessoal a maneira com que sempre
ludibria a morte, tratando-a com a
intimidade de uma melhor amiga.
Nachtergaele e o diretor Guel Arraes são dois mágicos. A pobreza
tão necessária ao assunto e que as
tábuas de um palco que rangem ao
peso do talento cômico ou mesmo
dramático de um ator viviam uma
amizade falsa. Os dois mostraram
que a maciez da película é que é
mais amiga com sua riqueza. Tolice. O dinheiro é amigo de todo
mundo. Quantos tolos se transformaram e tanto enganaram só porque o bolso dele estava repleto.
Com o talento especial que o Guel e
o Matheus (ufa!) sempre exibem,
personagens inevitáveis para o folclórico têm um sabor novo e luxuoso. Padre como o Rogério Cardoso e bispo como o Lima Duarte
têm uma comicidade impossível
de quem inaugura personagem.
Há magia no toque que transforma
essa gente. Assim como na mulher
dadeira da Denise Fraga.
Suas caretas de sempre viraram
uma novidade. Não se pode dizer o
mesmo do cangaceiro do Marco
Nanini nem do padeiro do Diogo
Vilela. Aí o Matheus (ufa!) foi um
companheiro, a comicidade todinha era de propriedade reconhecida dos ótimos dois...
Embora fosse breve a espera entre um e outro capítulo, vai ser
muito melhor quando se puder
avaliar o prazer na exibição corrida do filme. Como foi na peça. Ver
o fôlego cômico do Matheus correndo desimpedido já é um prazer
que se adivinha. Selton Mello tão
ajudado e tão correto que na farsa
foi sempre muito melhor como namoradinho. Prato feito e muito
cheio vai ser saboreado pela borda.
Que o dia não demore. Fernanda
Montenegro dê uma ajuda na pressa. Compadecida que ela é.
Texto Anterior: Cinema: Mulher nua está em "Bernardo e Bianca" Próximo Texto: MPB: CD traça panorama alternativo da bossa Índice
|