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CINEMA
Dois documentaristas paulistanos focalizam a vida na periferia e tentam analisar o papel do movimento hip hop
Capão Redondo é visto por dentro e "desabafa" sua dor
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
"É da Rede Globo?"
"Não. Isso é cinema."
"Se você quiser, tem um presunto lá embaixo."
A "oferta" foi feita no cemitério
São Luiz, periferia de São Paulo,
ao cineasta Noel Carvalho, que
dava início à captação de imagens
para o documentário "Novos
Quilombos de Zumbi".
Com quase 18 horas de material
gravado -as entrevistas tiveram
início no primeiro semestre de
2000-, Carvalho se prepara agora para editá-lo em 26 minutos,
para serem exibidos na televisão.
A finalização do filme foi viabilizada por investimento de R$ 20
mil da CPC-Umes (Centro Popular de Cultura da União Municipal de Estudantes Secundaristas).
A primeira fase da produção contou com apoio do Instituto de Artes da Unicamp.
"Novos Quilombos de Zumbi"
pretende mapear a região do Capão Redondo sob três aspectos
-o do movimento hip hop, o da
produção artística de escritores e
artistas plásticos moradores do
local e o das iniciativas de ação social empreendidas por associações de moradores e lideranças
comunitárias.
Mas o documentário quer, sobretudo, contrapor-se a outros filmes que tratam da periferia sob o
prisma de que "a cultura recupera", de acordo com o cineasta.
"É uma demagogia que despolitiza. Tenho horror a essa visão
culturalista típica da classe média
ilustrada que vê de fora", diz Carvalho, 38, morador do Jardim São
Luiz desde que nasceu.
Como exemplos de filmes dos
quais discorda, Carvalho cita os
documentários "O Rap do Pequeno Príncipe", de Marcelo Luna e
Paulo Caldas, e "Notícias de uma
Guerra Particular", de João Moreira Salles e Kátia Lund.
O cineasta cursa doutorado em
sociologia na USP e diz que vêm,
sim, sendo engendradas alternativas para a superação da violência
na periferia, mas na forma do
"diálogo da sociedade civil organizada com o poder público". Em
síntese: "A periferia não é barbárie", afirma Carvalho.
A narrativa de "Novos Quilombos de Zumbi" deverá ter condução clássica, assentada na justaposição de blocos de entrevista e trilha sonora pontuada pelo rap.
"Odeio maneirismos de câmera", diz o cineasta. O responsável
pela fotografia do documentário é
o professor Adilson Ruiz.
Noel Carvalho integra o movimento "Dogma Feijoada", espécie de versão nacional do decálogo dinamarquês que propõe um
cinema de muito conteúdo e poucos efeitos. No caso, voltado para
a imagem do negro na cinematografia nacional.
É também autor, com Alessandro Gamo, de "O Catedrático do
Samba", documentário sobre
Germano Mathias, realizado em
1999 e que deve ser lançado em
DVD até o final deste ano. Carvalho acaba de fundar, com cinco
outros cineastas -Gamo, Eduardo Kishimoto, Luís Alberto, André Franciolli e Artur Autran-, a
Cooperativa de Realizadores de
São Paulo. "Queremos fazer filmes baratos e rápidos, de relevo
social e sem dinheiro do governo", afirma.
A primeira parcela de patrocínio para a conclusão de "Novos
Quilombos de Zumbi" deve ser
repassada em março. A conclusão
do documentário está prevista
para o segundo semestre.
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