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O traço moderno de Goya
Exposição no Masp reúne, a partir de domingo, 218 gravuras de séries do artista espanhol;
criadas entre o final do século 18 e o começo do 19, obras anteciparam o surrealismo e o
expressionismo
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
O final do século 18 e começo
do 19 representa, na história da
arte, o início do rompimento
com as tradições acadêmicas da
pintura e o prenúncio de novas
formas de abordar o fazer artístico, que desembocariam no
modernismo ao questionar o
realismo na representação. Entre os principais artistas dessa
fase está o espanhol Francisco
de Goya (1746-1828).
Artista fértil, Goya realizou
cerca de 500 pinturas a óleo e
300 gravuras. Foi nesse último
gênero que ele exerceu maior
liberdade de expressão, pois
eram obras que fazia por sua
própria vontade, e não retratos
encomendados por personalidades do poder, ao qual sempre
esteve vinculado.
A partir de domingo, para o
público, 218 dessas gravuras,
que compõem as quatro séries
de Goya, estarão, pela primeira
vez no Brasil, expostas no Museu de Arte de São Paulo.
O Masp, que tem uma dívida
de quase R$ 10 milhões, conseguiu viabilizar a mostra graças
ao patrocínio do banco espanhol Caixanova, em parceria
com o Instituto Cervantes. O
custo não foi divulgado.
Por criar as gravuras a partir
de temas que ele próprio escolhia e poder representá-las livremente, Goya produziu
obras que adiantaram escolas
que iriam se consolidar apenas
no século 20, como o surrealismo e o expressionismo. "Veja
como ele aborda o mundo dos
sonhos, na série "Disparates", de
maneira psicanalítica, como só
os surrealistas fariam muito
mais tarde", sublinha o curador
do Masp, Teixeira Coelho.
Um exemplo que o curador
aponta é uma gravura na qual
se vê uma mulher sendo levada
por um cavalo. Ao observá-la
atentamente, nota-se no canto
esquerdo uma figura que parece uma rocha, mas também poderia ser a cabeça de um cachorro engolindo uma mulher.
"Há uma série de simbolismos
possíveis, como o cachorro representando seu pai, e o cavalo,
a amante da mãe", diz Teixeira.
Outra face
As séries apontam um outro
aspecto importante na obra: ele
acaba sendo um cronista de seu
tempo. "Nessa obras podemos
ver, de forma crítica e sarcástica, o modo como os espanhóis
viviam. Ele acaba sendo um
chargista, pois aborda temas da
política local, mas é também
um cartunista, pois torna esses
temas universais."
A exposição ocupa quatro salas no segundo andar, que foram alteradas, pois ali se encontra a coleção permanente
do museu. Um dos motivos para a escolha é que o Masp conta
com quatro pinturas do espanhol. "Creio que uma das razões pelas quais a Caixanova
escolheu o Masp para expor as
obras seja esse conjunto importante de pinturas de Goya",
diz Coelho.
Tais pinturas destoam das
gravuras, pois são retratos feitos por encomendas oficiais,
menos delirantes do que as séries expostas. Segundo o curador, "é importante ressaltar
que se trata de um outro critério de gravura. Naquela época,
elas eram as únicas imagens
que podiam circular, pois não
existiam revistas ilustradas, e o
interesse dele era que as pessoas, depois do jantar, observassem essas gravuras como
uma forma de diversão, precisando desvendá-las".
A maioria das gravuras nem
sequer é numerada ou assinada, já que a circulação, e não a
validação das peças como obras
de arte, era a principal preocupação de Goya.
"As pessoas precisariam vir
ao menos três vezes ao Masp
para se darem conta da complexidade dessas séries, senão elas
terão apenas uma impressão
visual e não um olhar detido",
diz Coelho. Mas, por R$ 15 a entrada, isso representaria um
custo um tanto alto. "Estamos
estudando com a direção do
museu uma forma de permitir
que, após a primeira visita, as
pessoas possam retornar sem
pagar novamente."
Uma das formas de facilitar a
tarefa do visitante é a oferta de
folhetos explicativos sobre algumas obras, em bancos espalhados pela mostra. "Mas eu tenho minhas dúvidas se é função
do museu explicar tudo ou permitir que cada um faça sua leitura", diz Coelho.
GOYA: AS GRAVURAS DA COLEÇÃO CAIXANOVA
Quando: abertura, sábado, dia 17,
11h30 (para convidados); de ter. a
dom.. das 11h às 18h. Até 20/5
Onde: Museu de Arte de São Paulo (av.
Paulista, 1.578, SP, tel. 0/xx/11/3251-5644)
Quanto: R$ 15
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