São Paulo, quinta-feira, 15 de abril de 2004

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POLÍTICA CULTURAL

Decreto presidencial restitui à Secretaria do Audiovisual aprovação e fiscalização de projetos de filmes

Gil amplia influência do MinC no cinema

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

A Secretaria do Audiovisual do MinC (Ministério da Cultura) assumiu parte das atribuições da Ancine (Agência Nacional do Cinema), por meio de decreto (nš 5.036) publicado no "Diário Oficial" da última quinta, com as assinaturas do presidente Lula e do ministro Gilberto Gil (Cultura).
O decreto é a terceira modificação na estrutura do MinC promovida no governo Lula. As duas anteriores foram feitas também por meio de decretos, datados de agosto e novembro de 2003 e revogados pelo atual documento.
Tornou-se responsabilidade da Secretaria do Audiovisual (que voltou a ser assim chamada, abolindo a nomenclatura Secretaria para o Desenvolvimento das Artes Audiovisuais, estabelecida no decreto anterior) "aprovar e controlar a execução de projetos" de filmes financiados por patrocínio, por meio das leis Rouanet e do Audiovisual.
Quase todos os longas-metragens feitos no Brasil são produzidos com o uso dessas leis de renúncia fiscal (pelas quais o governo abre mão de receber, a cada ano, um percentual do Imposto de Renda, autorizando o contribuinte a investir o valor na execução de projetos culturais).
Para captar o patrocínio, os projetos de filmes necessitavam solicitar primeiro a aprovação de seus orçamentos pela Ancine. Cabia também à agência acompanhar a captação do dinheiro e analisar a prestação final de contas dos filmes, fiscalizando o uso dos recursos públicos.
Pelo novo decreto presidencial, passa a ser também papel da Secretaria do Audiovisual "elaborar e submeter ao Conselho Superior do Cinema a política nacional do cinema e do audiovisual".
O Conselho Superior do Cinema é formado pelos titulares de nove ministérios (Casa Civil, Comunicações, Cultura, Desenvolvimento, Educação, Fazenda, Justiça, Relações Exteriores e Secretaria de Comunicação de Governo) e por nove personalidades civis, indicadas pela Presidência.
O conselho foi previsto na medida provisória 2.228 (de 9/2001, que criou também a Ancine) como órgão da Casa Civil.

Projeto de lei
A transferência de responsabilidades da Agência Nacional do Cinema para o Ministério da Cultura ocorreu às vésperas do envio ao Congresso Nacional de projeto de lei que trata do funcionamento das agências reguladoras e prevê a garantia de estabilidade para os seus presidentes.
O diretor-presidente da Ancine, Gustavo Dahl, foi nomeado durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e é considerado pela equipe do Ministério da Cultura um opositor político do governo Lula.
O secretário do audiovisual, Orlando Senna, diz que "esse decreto é mais um passo na reorganização institucional do Executivo e tem o anteparo da Constituição Federal, segundo a qual é privado do presidente dispor da organização do Executivo".
Questionado se o decreto 5.036 se antecipa ao projeto de lei das agências reguladoras, para garantir ao MinC margem de ação mais ampla em relação à Ancine, Senna afirma: "É uma interpretação sua, que posso acompanhar, assim como todo mundo que presta atenção nessas coisas".
O secretário diz que, "na prática e no momento", a aprovação e a fiscalização de projetos de filmes continuará sendo feita pela Ancine, "mas como uma atribuição do Estado delegada pela Secretaria do Audiovisual à Ancine".
Procurado para entrevista, Dahl preferiu não falar com a reportagem, mas declarou, por meio de sua assessoria: "A Ancine considera que o que está atualmente em vigor é a medida provisória 2.228, que tem efeito de lei, até que o Congresso Nacional a reveja".

Preocupação
O exibidor Luiz Severiano Ribeiro, membro do Conselho Superior de Cinema, instalado no último dia 11 de fevereiro, se diz preocupado com a medida. "O conselho mal foi estabelecido e pode ser enfraquecido, já que eles [a Secretaria do Audiovisual] é que vão formular as políticas."
O diretor de TV Gabriel Priolli, também titular do conselho, discorda. "Não vejo isso como enfraquecimento. Sempre entendi o conselho como órgão auxiliar do Executivo. Não é papel exclusivo do conselho ser o formulador de políticas, porque isso eliminaria o papel do ministério."
O montador Giba Assis Brasil, membro-titular do conselho, diz não acreditar que o decreto possa "mudar a relação do conselho com os órgãos de governo e de Estado, como a Secretaria do Audiovisual e a Ancine". Assis Brasil lembra que o conselho se reuniu apenas uma vez e "aguarda que o ministério apresente sua proposta de marco regulatório do audiovisual para discuti-la".
O decreto 5.036 criou a Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura, a sétima na estrutura do MinC, assumida por Sérgio Xavier. Antes, o Fomento e Incentivo à Cultura era uma diretoria no quadro da Secretaria Executiva.


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