São Paulo, sexta, 15 de maio de 1998

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"A Quinta Estação' é conto

BERNARDO CARVALHO
especial para a Folha

"A Quinta Estação" é a história de um casamento e de um ônibus. Lembra uma daquelas fábulas do folclore oriental -no caso, persa-, um conto moral cujo título podia muito bem ser "O Casamento e o Ônibus".
Rafi Pitts, o jovem cineasta iraniano (nasceu em 1966) que estréia na direção de longas com esse filme de 97, não é, entretanto, ingênuo. Estudou no Harrow College, em Londres, foi assistente do "ex-enfant terrible" do cinema francês, Leos Carax, e do às vezes bem-sucedido Jacques Doillon.
O encanto do filme, ao contrário de uma outra tendência de retomada do folclore também presente no recente cinema iraniano ("Gabbeh" é o exemplo máximo), é nutrido por uma opção clara pela fabulação.
Como se o folclórico aqui não fosse mais apenas um elemento oportunista de sedução visual do espectador (sobretudo estrangeiro), mas servisse para o diretor transformar uma aldeia perdida no interior do Irã.
Nesse sentido, "A Quinta Estação" se afasta também da originalidade narrativa dos filmes de Kiarostami. É mais clássico.
A história tem início com um casamento arranjado, que serviria para pôr fim aos conflitos entre dois clãs inimigos se, a certa altura, o noivo, irritado, não se rebelasse contra a situação, anunciando a quebra do acordo.
A partir daí, uma nova guerra começa, para culminar quando o noivo resolve introduzir no vilarejo um ônibus (o único veículo motorizado do lugar) com que pretende assegurar uma ligação diária e inédita com a cidade.
O ônibus serve como símbolo da "modernidade", do capitalismo e de um espírito mercantilista cujos efeitos nefastos até ali a comunidade desconhecia.
E é nesse ponto que a moral da fábula sobre a guerra e a paz corre o risco de resvalar na demagogia do culto da inocência e das tradições contra a corrupção da modernidade.
Mas é só um instante. Porque, no geral, essa inocência construída garante ao menos 80 minutos de um verdadeiro prazer cinematográfico.

Filme: A Quinta Estação
Produção: França/Irã, 1997 Direção: Rafi Pitts Com: Roya Nonahali, Parviz Poorhosseni Quando: a partir de hoje, no Espaço Unibanco, sala 4


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