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São Paulo, domingo, 15 de junho de 2003

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MÔNICA BERGAMO

Muito pano para mangas

Chris von Ameln/Folha Imagem
HOLOFOTE
Samuel Cirnansck, dos ônibus na 25 de março às prateleiras de Patrícia Fields em Nova York


Paris, aqui vou eu. O boom no setor da moda brasileira na última década despertou no coração de senhoritos e senhoritas o sonho de um dia chegar às glórias dos desfiles das capitais da alta-costura mundial. Pouca gente chegou lá. Ocimar Versolato conseguiu. Levou tombos, levantou. Alexandre Herchcovitch está lá; Fause Haten, em Milão; Carlos Miele, em Nova York.
 

Muita gente quer chegar lá (dica de Versolato: um bom assessor de imprensa é fundamental, para fazer lobby na mídia). Samuel Cirnansck é um dos aspirantes. Tem 27 anos. Faz roupas desde os 10, quando morava em Itapira (SP) com a mãe, a dona-de-casa Maria, e o pai, o despachante Ismael.
 

Na quarta-feira, Samuel apresentou sua coleção no Amni Hot Spot. O evento esquenta as baterias da cidade para a SP Fashion Week, no fim do mês. Nele estão estilistas em início de carreira, que são "adotados" e treinados até que um dia, quem sabe, possam chegar às passarelas da gloriosa Fashion Week.
 

(Outra dica de Versolato para os iniciantes: como os dois eventos, Amni e Fashion Week, são organizados pelo poderoso Paulo Borges, é fundamental, claro, se dar bem com ele. Versolato, aliás, se dá mal).
 

Há cinco anos, quando foi selecionado para o Amni, Samuel falou aos organizadores: "Quero fazer alta costura". Eram tantos sonhos que Márcia Matsuno, uma das organizadoras, falou: "Ó, Samuel, "pra" fazer isso você vai ter que ir para Paris".
 

Ele se conformou com o Brasil mesmo. Já fazia figurinos para teatro -trabalhou com Marília Pêra na ópera "Vitor ou Vitória"- e adotou estilo próprio, cheio de cores. Foi o mais aplaudido da quarta-feira. Até o ano passado, comprava tecidos na 25 de março de ônibus. Agora tem um Golf e uma Caravan 75. Seus vestidos custam mil reais. Já vende roupas na badalada loja de Patrícia Fields, em NY.
 

Ainda é cru em algumas coisinhas. Por exemplo, diz o que pensa do estilista Lino Villaventura. Acha as roupas bárbaras, mas não gosta de como as apresenta. "Cuidado. Você está falando com jornalistas", alerta uma sempre fundamental assessora de imprensa. "Digo isso na cara dele. É o que eu penso", responde Samuel.
 

Erica Ikezili, 26, está investindo no marketing. Já tem assessoria de imprensa -a mesma da SP Fashion Week. Firmou parceria com um restaurante japonês: quem leva peças de sua loja toma saquê no Nakombi, e quem toma saquê no Nakombi leva peças de sua loja.
 

Simone Nunes, 25, dá consultoria a uma marca de jóias, que empresta a ela peças para desfiles. "A realidade do mercado é bem diferente da teoria da faculdade", diz ela, formada em 1999 na Santa Marcelina. "Não quero perder a ambição de criar um conceito, mas sei que tenho que vender."
 

O Brasil, todos sabem, é um país difícil -cada vez mais difícil. Paulo Borges dá a sentença: esses garotos, por mais talentosos que sejam, vão demorar dez vezes mais tempo para se firmar do que seus antecessores. Brasileiro, diz ele, é novidadeiro e gosta de roupa. Muito desejo, pouca renda, produtos encalhados nas prateleiras. Haja pano para tanta manga.

E-mail: bergamo@folhasp.com.br

COM CLEO GUIMARÃES E ALVARO LEME


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