São Paulo, quarta-feira, 15 de junho de 2005

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PERSONALIDADE

Após se livrar das acusações de abuso sexual, cantor enfrenta dívidas e procura meios para retomar carreira

Shows podem não salvar Michael Jackson

JEFF LEEDS
DO "NEW YORK TIMES", EM LOS ANGELES

Mesmo antes de entrar em julgamento por acusações de abuso sexual contra crianças, Michael Jackson vinha enfrentando o declínio de sua carreira musical e uma miríade de problemas financeiros. E, embora uma condenação pudesse ter destruído qualquer chance de recuperação, executivos do setor de entretenimento disseram anteontem que o veredicto de inocência ainda assim coloca o antigo rei do pop numa estrada difícil para restabelecer sua credibilidade como artista.
"É uma batalha árdua", disse Londell McMillan, veterano advogado da indústria fonográfica, que ajudou a orientar as carreiras de astros como Prince. "Culturalmente, ele jamais voltará a ser o Michael Jackson que um dia conhecemos. Uma coisa que sabemos é que sua voz está gravada permanentemente nas memórias dos ouvintes de todo o mundo. Mas não voltará a ser o ícone e o criador de tendências que foi."
As vendas dos álbuns de Jackson vêm despencando desde o sucesso explosivo de "Thriller", de 1982, que, com 26 milhões de cópias, é o segundo disco mais vendido na história dos EUA -depois apenas de uma compilação dos sucessos do Eagles.
Seu mais recente CD de estúdio, "Invincible", vendeu 2,1 milhões de cópias no país desde seu lançamento, em 2001. E Jackson, 46, precisa superar uma biblioteca de reportagens de tablóides que o retratam como uma relíquia envelhecida e frágil do pop -para não mencionar a perspectiva de perder o controle sobre seus negócios, à medida que enfrenta dívidas estimadas em US$ 270 milhões (R$ 663 milhões).
Mas seus conselheiros alegam que ele seria capaz de levantar milhões de dólares rapidamente com uma turnê internacional e a venda de suas gravações. Ainda que muitos anos tenham se passado desde que Jackson foi a representação da inocência e energia juvenis, ele continua a ser um astro mundial e parte de uma cultura na qual acusações criminais não parecem preocupar os fãs. O cantor de rhythm and blues R. Kelly, por exemplo, desfrutou de considerável sucesso comercial mesmo após acusações de pornografia infantil contra ele.
Até mesmo pessoas próximas a Jackson parecem não saber exatamente o que ele pretende fazer a seguir. Seu irmão Jermaine, quando perguntado se o cantor retomaria a carreira, disse em entrevista a Larry King na noite de segunda-feira que Jackson "vai descansar, por enquanto". E acrescentou: "Mas está em seu sangue. Está em seu sangue".
Executivos da indústria fonográfica dizem que Jackson talvez seja até capaz de recuperar seu trono pop. "Para entender a situação, nesse caso, é quase necessário um antropólogo cultural", disse Richard Rosenberg, que se aposentou neste ano como diretor da divisão de música da agência William Morris. "Eu imaginaria que a maioria das pessoas que não tinham opinião formada quanto à sua culpa agora diriam que o sistema funcionou e 12 pessoas daquela cidade conservadora o consideraram inocente."
"Ele não é tão diferente das outras celebridades, que podem ter estilos de vida bem diferentes e enfrentar vícios como as drogas bem como adultérios públicos", disse Rosenberg. "O público não se incomoda."
Jackson não faz uma turnê nos EUA há mais de 15 anos. A última aconteceu em 1997 e faturou mais de US$ 90 milhões (R$ 221 milhões), de acordo com a revista "Pollstar", que acompanha resultados financeiros de shows.
Para que Jackson empreenda um esforço sério de reconquista de suas passadas glórias, até mesmo os simpatizantes dizem que ele precisa retornar ao desempenho enérgico que exibe seu talento musical e para a dança capaz de eletrizar audiências.
"Ele sempre foi um gênio; agora precisa simplesmente maximizar seus dotes", disse Rodney Jerkins, o produtor que trabalhou com Jackson em "Invincible". Atrair os jovens fãs de hoje "é uma missão difícil de realizar na idade dele", disse. "Creio que ele deveria mesmo sair em turnê, se concentrar nos fãs que já tem e conquistar novo público com a divulgação boca a boca."
Um retorno aos shows pode não bastar para proteger Jackson das dívidas. Ele já se vê reduzido a um simples peão em uma complexa partida de xadrez financeiro promovida quanto ao destino de sua valiosa participação na Sony ATV Music, a editora que controla e administra os direitos autorais sobre mais de 250 composições dos Beatles, um dos catálogos mais preciosos da música. A participação acionária de Jackson serve como caução para alguns de seus empréstimos.
Jackson e seus assessores há muito vêm descartando as sugestões de que ele poderia ter de vender sua participação nesse empreendimento a fim de cobrir suas dívidas. Mas pessoas que trabalham com Jackson dizem que, com o empréstimo adquirido por um credor possivelmente menos paciente, se tornou muito mais provável que ele tenha de vender totalmente sua participação na editora de música ou reduzi-la.
Não importa de que maneira Jackson opte por enfrentar seus problemas financeiros, as dificuldades legais que o afligem estão longe de encerradas, e algumas podem ainda lhe causar embaraço. Em processo aberto em novembro e suspenso à espera do julgamento de anteontem, um ex-assessor, F. Marc Schaffel, alega que o cantor lhe deve mais de US$ 2 milhões (R$ 4,9 milhões) em empréstimos pessoais.
Schaffel diz que Jackson estava desesperado por dinheiro para bancar seus hábitos de consumo descontrolado e que jamais reembolsava as despesas pagas pelo subordinado ou os empréstimos.
Tendo entregado o último disco de estúdio que devia à gravadora sob seu lucrativo contrato de 1991 com a Sony Music, Jackson pode fechar o tipo de contrato que quiser para o financiamento e a distribuição de futuros trabalhos.
Seu mais recente CD, uma coleção de sucessos com o título "Number Ones", vendeu 906 mil cópias, de acordo com estimativa da Nielsen SoundScan. O disco foi lançado no dia em que as autoridades deram uma batida em Neverland em busca de evidências para o processo criminal.


Tradução Paulo Migliacci

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